Dial P for Popcorn: outubro 2011

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

BEGINNERS (2010/11)



What happens now? I don't know.


Como é que se criou essa ideia de que há almas gémeas, este mito de que estamos destinados a encontrar alguém que fique connosco para sempre e nos complete a todos os níveis? Não sei. Contudo, não é isto, afinal, que todos procuramos na vida? Passamos os dias mergulhados num oceano de mil e uma sensações, numa amálgama de emoções, de momentos e cenas que todas juntas compõem a nossa vida, a nossa personalidade, a nossa pessoa, em busca, esperançados, da pessoa que nos transforme a nossa existência. O que ninguém nos explicou é que o ser humano não foi feito para estar junto com alguém. Crescemos com a ideia que para sobreviver temos de saber viver na solidão, ser opinativos, decididos, independentes e fortes, não importa as circunstâncias. E de repente lá vem alguém que nos põe a colocar tudo em perspectiva, que nos confunde, encanta e emociona, que nos muda para sempre e nos faz sentir como se a vida sem ela não faz sentido. Em seguida, vem a parte complicada: aquela de saber incluir quem amamos nas nossas decisões, na nossa vida. E é aí que a maior parte de nós falha. Se bem que Mike Mills tem a vantagem de estar a aproveitar uma história verídica da sua vida para nos proporcionar esta inventiva, prodigiosa e preciosa comédia romântica chamada "BEGINNERS", é impossível não notar a sua voz distintiva ao longo de toda a película, do fascinante argumento à brilhante direcção de actores, que revela que de facto estamos perante um realizador a seguir atentamente no futuro.


"BEGINNERS" alterna brilhantemente entre a comédia subtil e o toque virtuoso, despretensioso do melodrama familiar, mostrando-nos como o passado das personagens se interliga e influencia o presente e como o presente nos leva muitas vezes a questionar actos do passado, como todos nós seres humanos somos imperfeitos, confusos, ignorantes e impotentes face ao amor, à felicidade, à tristeza, à perda e à solidão - não sabemos bem o que havemos de fazer e, mais vezes do que queremos admitir, nesta sociedade verdadeiramente sociopática e de emoções amorfas e complicadas em que vivemos, tomamos as decisões erradas e acabamos por arruinar tudo.


"BEGINNERS" abre com a morte de Hal (Christopher Plummer) que, ao perder a sua esposa de mais de quatro décadas, decide confessar ao seu filho Oliver (Ewan McGregor) que toda a sua vida foi homossexual e que portanto pretende agora aproveitar esta nova oportunidade que a vida lhe dá para fazer tudo diferente. Oliver narra-nos o filme através de uma série de imagens e lirismos, seja poemas, frases icónicas da história ou pequenas narrativas pessoais acerca de si, da sua família e da sua vida. Oliver, que é um artista que trabalha como desenhador, ilustra as várias fases do filme enquanto este alterna entre o passado, os anos 50, nos quais Oliver passava a maior parte do tempo com a mãe, Georgia (Mary Page Keller), que lhe acabou por passar alguma da indiferença, passividade e natureza contemplativa com que reagia aos acontecimentos da vida, presa durante anos e anos num casamento infeliz; o período de tempo entre a morte da mãe e da morte do pai, em que observamos um deleitoso, enternecedor e até divertido retrato de um homem que nunca desistiu, mesmo aos 75 anos, de ser feliz e que, na sua intrépida curiosidade e mesmo lutando contra um cancro que lhe foi minando a vida, foi aprendendo o que é ser gay nos dias de hoje e encontra o amor nos braços de um homem imensamente mais novo que ele, Andy (Goran Visnjic); e meses depois, em que um Oliver imerso numa depressão e apatia profundas descobre novo rumo na sua vida ao se encontrar com Anna (Mélanie Laurent), uma misteriosa e encantadora rapariga que abana com os mecanismos de defesa que Oliver vinha aperfeiçoando nos últimos tempos e o obriga a, pela primeira vez na vida, correr atrás do que quer, tal e qual como o pai fez antes e que nos mostra o quão difícil é para ele, que foi ensinado toda a vida a guardar segredos, a partilhá-los com alguém.


O principal atributo de "BEGINNERS" é a franca sinceridade, honestidade e calor das personagens. Aqui não há heróis nem vilões, vencidos nem vencedores. Só um conjunto de pessoas à deriva na vida, em busca de algo que lhe dê sentido. Christopher Plummer enche o seu Hal de graça, alma e uma indelével e inexplicável alegria de viver, mesmo nos piores momentos, exibindo orgulhosamente a lição moral de que o nosso exterior nem sempre reflecte bem o que o nosso interior é, tornando impossível não nos perdermos na empatia do seu olhar, na generosidade do seu espírito, na profundidade da sua caracterização. Uma nomeação - e até uma vitória - nos Óscares seria o prémio merecido para uma interpretação tão rica, tão melíflua, tão inesquecível. Ewan McGregor é exímio na forma como diz muito com tão pouco, com uma expressão ou um olhar tão cruel e devastador como apropriado, partilhando connosco o seu sofrimento, as suas dúvidas e incertezas acerca da sua vida, o seu ressentimento mas também o seu orgulho e amor para com o seu pai por recomeçar a vida mesmo enquanto ele, paradoxalmente, perece. A melhor interpretação da sua carreira, para mim. Há que realçar também o enorme contributo das duas mulheres na vida de Oliver: Mary Page Keller tem a tarefa ingrata do filme, mas uma que cumpre com elevada distinção, ao ser capaz de dar vida à sua Georgia de forma tão realista e nua, coerentemente entrelaçando, nas nossas cabeças, a explicação de porque razão Oliver é como é e Mélanie Laurent por nunca ter entrado no caminho fácil com a sua Anna e por ter compreendido que o lado imprevisível e difícil de entender da sua personagem, aquele que consegue ser, em simultâneo, terno e sensível e indiferente e frio, é o que a torna tão única e distinta. Finalmente, falar do verdadeiro astro do filme, o cão Arthur, um extraordinariamente fiel Jack Russell com uma habilidade muito particular: a de ser incisivo na forma crítica como analisa a vida de Oliver.




Um filme que mais parece um espelho da nossa vida, que captura na perfeição o amor e a melancolia em todas as suas formas, que se atreve a abordar assuntos difíceis e o faz de forma poética, sonhadora e cativante, ao som puro e gentil da linda banda sonora de Palmer, Reitzell e Neill, "BEGINNERS" é um filme que vale a pena ver e rever - mais não seja pelo sentimento inconfundível de sair da sala de cinema após ter visto um filme completo, quase perfeito, que me mexe com as emoções, que me deixa quase em lágrimas e que me faz feliz por estar vivo e neste mundo imperfeito e imprevisível onde tudo é possível. Como apaixonar-me. Ele nunca desistiu, diz Anna na cena final do filme acerca de Hal. É isso mesmo que nunca devemos deixar de fazer. Não desistir de ser feliz.



Nota:
A/A-

Informação Adicional:
Realização: Mike Mills
Argumento: Mike Mills
Elenco: Ewan McGregor, Mélanie Laurent, Christopher Plummer, Mary Page Keller, Goran Visnijc
Banda Sonora: Roger Neill, Brian Reitzell e Dave Palmer
Fotografia:
Ano: 2010

Trailer:


quinta-feira, 27 de outubro de 2011

LES CHANSONS D'AMOUR (2007)



Que Christophe Honoré é uma das grandes promessas do cinema francês, penso que é um facto consumado. Agora, que Louis Garrel é um dos melhores actores europeus dos últimos tempos e, sem dúvida, um dos melhores mundiais entre a sua geração, é que infelizmente não me parece ainda perfeitamente difundido por entre o público geral. E isso entristece-me. Louis Garrel é um dos actores que mais me entusiasma enquanto contracena. É, sem dúvidas, um indivíduo com uma capacidade de representar fora do normal, conseguindo personificar a personagem-modelo daquilo que é, para mim, o cinema francês: O herói solitário, o homem romântico, apaixonado, que sofre por amor, que se encontra desencaixado, desenquadrado da realidade. É essa noção de beleza harmoniosa (estética, instrumental, visual - quase poética) que eu admiro no cinema francês. A paixão pela arte.


Les Chansons d'Amour não é o primeiro filme que vejo de Honoré. Há uns anos tive a possibilidade de ver o Dans Paris (sobre o qual um dia vos falarei) e, já aí, tive uma experiência singular e marcante. Dans Paris não é um filme brilhante, não é um filme marcante, não é um filme que vá ocupar lugar entre os melhores da sua década. Mas é, isso sim, uma representação fantástica de um quotidiano, de um habitat mundano onde qualquer um se pode encaixar e viver. E, tal como em Les Chansons d'Amour, Louis Garrel brilha.


Um filme onde tudo encaixa na perfeição. Onde tudo se desenrola com uma naturalidade, um propósito intrínseco, onde as músicas de Alex Beaupain (impossível escolher a melhor) preenchem os hiatos entre os momentos da representação clássica. Beaupain faz o elenco cantar sobre amor, sobre solidão, sobre saudade, sobre a dor da perda, sobre o luto. Não vou desvendar muito mais sobre um filme que enche a alma de quem o vê. Em Les Chansons d'Amour, Honoré celebra ao amor.

Nota Final:
B+



Trailer:





Informação Adicional:

Realização:
Christophe Honoré
Argumento: Christophe Honoré
Ano: 2007
Duração: 100 minutos

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

BRITISH TV - MISFITS (SEASON 3)




Não tenho por hábito anunciar o regresso de séries aqui no blogue. Faço-o em casos excepcionais, quando o regresso é tão aguardado que várias semanas antes começo à procura de trailers e informações sobre a nova temporada. Misfits é um caso excepcional. Uma lufada de ar fresco numa britcom que se distingue pela sua capacidade admirável de, ano após ano, geração após geração, se renovar e trazer ideias novas para o mercado.


No entanto, ao fim de duas temporadas de grande qualidade, viciantes e electrizantes, a série criada por Howard Overman perdeu a sua principal figura: Robert Sheehan, que representava o papel de Nathan Young, era a grande alma, a figura principal e o grande motor de toda a série. Mesmo que a história não girasse à sua volta, o seu carisma, a sua qualidade enquanto actor transformavam-no no centro das atenções. Sheehan é uma natural born star e será, sem dúvidas, um dos grandes nomes da representação em Inglaterra no médio prazo. É uma perda irreparável (e porque não arriscar insuperável?) para esta série que tantas coisas novas e arrojadas trouxe para a televisão.




Em jeito de despedida, o staff de Misfits criou uma pequena despedida para a personagem de Nathan Young, numa short history intitulada de "Vegas Baby" lançada a meio de Setembro e que serve também para a apresentação de Rudy, a nova personagem que ocupou a vaga deixada por Nathan. Aqui vos deixo alguns vídeos e algumas imagens sobre aquilo que poderemos esperar desta nova temporada. Regresso está marcado para dia 30 de Outubro.

sábado, 22 de outubro de 2011

Belle du Jour, Belle Toujours!


São raras as actrizes que se conseguem transcender num grande papel, quanto mais em vários. Ainda mais raras são as actrizes estrangeiras que têm essa possibilidade. E, se tivermos em conta que até aos dias de Marion Cotillard e Juliette Binoche, foi esta a única actriz francesa a penetrar nas listas sagradas de casting de Hollywood e que isto tudo se deu logo após a Idade de Ouro do cinema norte-americano, nos anos 50 e 60, ainda mais impressionante se torna.
Que esta actriz tenha conseguido o feito de se reinventar mil vezes, de se perder em milhares de papéis, pequenos ou grandes, para maiores e menores mestres, de Honoré a Buñuel, de Polanski a Demy, de Téchiné a von Trier, de consistentemente trabalhar na plenitude dos seus talentos e capacidades e mantendo intocável a beleza marcante que a imortalizou é uma prova do gigantesco brilho, carisma e talento da aniversariante Catherine Deneuve, que comemora - notem bem - 68 anos de idade!


Tenho que admitir desde logo que não sou um completista da filmografia de Deneuve, embora gostasse muito de o ser. Do que vi, não há um filme em que o misticismo, a aura de mistério, a beleza fulgurante, o sorriso que emana simpatia e calor, não estejam presentes. As minhas interpretações favoritas dela são em "Repulsion" de Roman Polanski, em "Les Parapluies de Cherbourg" de Jacques Demy, em "Dancer in the Dark" de Lars von Trier, "Ma Saison Préférée" de André Téchiné, "Un Conte de Nöel" de Arnaud Desplechin e finalmente - e obviamente - na obra-prima de Luis Buñuel, "Belle de Jour".


 A inesquecível interpretação dela em "Belle de Jour", em particular, funciona como um ensaio de condensação das qualidades de representação de Deneuve. Hipnótica, sensual, electrizante, misteriosa, enigmática, uma verdadeira mulher de sonho, a lembrar Jane Fonda em "Klute", Nicole Kidman em "Eyes Wide Shut" ou Anne Bancroft em "The Graduate", Catherine Deneuve entrega-nos uma performance inspirada, algo que dela ainda não tínhamos visto. Brilhante.

Portanto... Parabéns Catherine Deneuve! Que celebre muitos! E que continue sempre a surpreender-me, como fez o ano passado em "Potiche" de François Ozon. Que interpretação.


E vocês, qual consideram ser a melhor interpretação de sempre da enorme Catherine Deneuve?

INCENDIES (2010)

Aproveitando a Estreia Nacional de um dos Melhores Filmes de 2010, decidi recuperar a crónica que escrevi, há uns meses atrás, sobre Incendies, o nosso Filme da Semana.




"Dead is never the end of history"


Um dos meus filmes favoritos de 2010 merece, aqui, todos os meus elogios. É uma história criada com criatividade e ambição. Misturar temas tão controversos com aqueles que sustentam o argumento de Incendies, não é fácil e demonstra uma grande coragem por parte de toda a equipa que imaginou, criou e produziu este filme.



Tudo começa com a morte de Nawal Marwan (Lubna Azabal). Na leitura do seu testamento, os seus filhos gémeos Jeanne (Mélissa Désormeaux-Poulin) e Simon (Maxim Gaudette), são confrontados com uma dupla surpresa: Jeanne deverá entregar uma carta ao seu pai, que ambos julgavam falecido, e Simon deverá entregar uma carta ao seu irmão, do qual ambos nunca tinham ouvido falar.


Encarando aquele como apenas mais uma ideia lunática da sua mãe, Simon recusa-se a cumprir o último desejo da sua mãe. Apenas Jeanne aceita o desafio. Com base numa fotografia muito antiga da sua mãe e, graças ao auxílio do seu professor de matemática, parte em direcção ao médio oriente, local onde a sua mãe nasceu e cresceu, e onde uma dura e inesperada verdade a espera.
Ao mesmo tempo, vai-nos sendo contada a história da vida de Nawal Marwan. Uma mulher de ideais fortes, de uma coragem inabalável, que luta contra as su as adversidades, contra a injustiça enraizada na sua sociedade e que está decidida a encontrar o seu filho, que se vira forçado a abandonar enquanto jovem, devido a uma paixão proibida que desgraçara a sua vida e a sua família.


Numa edição perfeita, em que três tempos cinematográficos se misturam e envolvem com mestria e intenção, é nos contada esta apaixonante história, que nos prende às suas personagens, aos seus sentimentos e às suas vivências. Com uma banda sonora de apenas três músicas, nunca Radiohead se encaixou tão bem num filme.


Nota Final:
A-



Trailer:





Informação Adicional:
Realização: Denis Villeneuve
Argumento: Denis Villeneuve
Ano:
2010
Duração:
130 minutos

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

JOSÉ E PILAR (2010), por João Samuel Neves



"A Pilar, que ainda não havia nascido e tanto tardou a chegar."


José e Pilar. Porque José Saramago não seria Saramago sem Pilar. Porque Pilar del Río não seria Pilar sem Saramago. Um documentário fantástico, editado, filmado e produzido com imensa paixão, que explora com perspicácia a infinita imaginação de um dos maiores e mais sagazes pensadores dos tempos modernos. Um homem diferente de todos os outros, com uma visão singular do mundo e da religião, sem medo de tocar nos tabus das sociedade e de abanar os alicerces que sustentam a inabalável fé que muitos têm por Deus e pelo Cristianismo.


José e Pilar é uma honrosa e dignificante despedida de Saramago. Ao longo de todo o documentário (filmado entre 2006 e 2008) vemos um Saramago cada vez mais debilitado fisicamente. Paradoxalmente a esta deterioração exterior, facilmente percebemos que o génio continua lá. Que o humor mordaz e lacerante, que as expressões politicamente incorrectas maturaram com a idade e tornaram-se cada vez mais oportunas. Vemos um Saramago que, sentado no seu computador, produz e cria a uma velocidade improvável para os seus debilitados 85 anos. Vemos um Saramago que percorre o mundo, é adorado, admirado e procurado em qualquer ponto do Planeta. Um Saramago que não se cansa. Um Saramago que não se rende ao passar do tempo. Um Saramago que um Portugal (e Cavaco Silva) obtuso e retrógrado nunca soube acolher e compreender.


Mas José e Pilar tem mais para ver. Neste filme/documentário, o leitor poderá perceber a profunda intimidade de um casal, à partida, improvável. E, também neste documentário, o leitor perceberá que, ao lado de um grande homem, se encontra sempre uma grande mulher. E Pilar é uma grande mulher. Uma mulher que certamente deixará orgulhosa qualquer leitora que tenha a possibilidade de ver José e Pilar. É ela (como certa vez o próprio Saramago a rotulou) o seu Pilar. Em momentos de dificuldade, Pilar nunca deixa Saramago, e o amor que existe no casal respira-se em toda a película. É esta relação tocante que o realizador Miguel Gonçalves Mendes explorou de uma forma sublime. É o melhor de um filme onde o humor de Saramago nos diverte e entretém, onde a fotografia e a edição carregam o filme de uma tensão e um ambiente que envolvem o espectador e o colocam em Lanzarote, no mesmo espaço (físico e temporal) de Saramago.


Um digníssimo representante de Portugal na categoria de Melhor Filme Estrangeiro nos Oscars deste ano. Um dos melhores documentários que alguma vez vi. Um grande filme Português.


Nota Final:
A-


Trailer:




Informação Adicional:
Realização: Miguel Gonçalves Mendes
Argumento: Miguel Gonçalves Mendes
Ano: 2010
Duração: 125 minutos

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Trailer de THE DESCENDANTS, de George Clooney




Pela mão de Alexander Payne, realizador de Sideways (2004) e About Schmidt (2002) - dois filmes que recomendo vivamente ao leitor, chega-nos um dos mais badalados e esperados filmes norte-americanos do ano. Confesso que a mim, tanto o trailer como a descrição do imdb.com

A land baron tries to re-connect with his two daughters after his wife suffers a boating accident.

não me convenceram. O papel de George Clooney, considerado um dos mais fortes para a estatueta dourada de Melhor Actor Principal, é o género de interpretações que lhe fazem falta na carreira: o do homem solitário que carrega os males de uma vida plena de injustiças e momentos amargos. Não é o registo em que mais gosto de o ver (continuo a achar que nasceu para dizer "Nespresso, What Else?"), mas o passado de Alexander Payne obriga-me a dar-lhe uma oportunidade.

domingo, 16 de outubro de 2011

ONE DAY (2011)



"Whatever happens tomorrow, we'll have today. I'll always remember it."

Não é difícil explicar ao espectador comum sobre que género se debruça o novo filme de Lone Scherfig, que muito mostrou com o seu primeiro filme, o espectacular "An Education". Um híbrido entre as comédias românticas modernas e os clássicos dos anos 50 e 60, com a adição de sotaques britânicos, "ONE DAY", baseado no livro com o mesmo nome de David Nicholls e por ele adaptado para cinema, não evita que as comparações com o filme anterior de Scherfig e em particular as expectativas relativamente altas que o brilhantismo da obra literária adivinhava nos deixem ficar desapontados.


"ONE DAY" abre a 15 de Julho de 1988 em Edimburgo e mostra-nos como se conhecem, pela primeira vez, a idealista e sonhadora Emma Morley (Anne Hathaway) e o divertido e prático Dexter Morgan (Jim Sturgess). Visitamos sempre esse dia, que é conhecido em Inglaterra como o St. Swithin's Day, no decurso de vinte anos para ver como as vidas de Emma e Dex se intersectam e decorrem, enquanto ambos se descobrem a eles mesmos e um ao outro. O primeiro grande problema que tenho com o filme - e com o livro - é só os podermos encontrar neste dia, todos os anos. Todos os grandes eventos da sua vida - infinitamente mais interessantes do que o que nos é oferecido pelo filme em si - passam fora do ecrã e com isso perdemos muito do pano de fundo da vida destes dois personagens. Além disso, não parece minimamente estranho que todos os anos o 15 de Julho comece ou acabe com um evento de significativa importância? E pessoas entram e saem da sua vida de forma algo aleatória que, apesar de conseguirmos entender o porquê do seu surgimento e desaparecimento, nos deixam um amargo de boca de não sabermos a história toda e muitas perguntas por responder a que o filme parece tentar fugir. Entre estas pequenas personagens secundárias, ressalvo Allison (Patricia Clarkson), mãe de Dexter, luminosa e enternecedora nos breves minutos que surge em cena.
Anne Hathaway acaba por arruinar o que era uma personagem perfeitamente acessível no livro. A Emma Morley de Hathaway passa de esperta a irritante, de irónica a aborrecida e de teimosa a amuada. É difícil aceitar que Dexter consiga sequer suportá-la, quanto mais ser amigo dela no início. Nem vamos falar do sotaque que tem mais variações que as cores do arco-íris. Já Jim Sturgess faz o que pode com um personagem que já era horroroso no livro. Devo dizer que fiquei bastante impressionado com a profundidade emocional que ele conseguiu retirar de um personagem oco e vazio de conteúdo tal como estava escrito, que é mau e desrespeitoso - um verdadeiro cabrão na essência da palavra - para todos com que contacta.



Penso que parte do problema de "ONE DAY" é querer levar-se muito a sério, tendo-se como um filme definidor de toda uma geração, como um filme que vem revolucionar a estrutura pálida das comédias românticas de hoje. Nada disso. O engenhoso sistema de só mostrar um dia em cada ano é divertido no início mas facilmente cansa e deixa-nos ver as suas falhas. O romance, além de óbvio e inevitável - problema patológico muito comum aos romances de hoje - parece ser adiado para lá do que é razoável. E uma realizadora tão competente como Scherfig e um escritor com talento como Nicholls não podem ser tão amadores ao ponto de como resultado final terem um filme repartido em duas partes imensamente desequilibradas. A primeira parte é praticamente insuportável. A segunda parte é agridoce e melíflua demais. Claro que a transformação de Dex tem tudo a ver com esta disparidade mas ainda assim a primeira parte do filme devia conseguir muito mais.


Talvez também o problema resida no facto de eu não ser o público-alvo deste tipo de filmes. Não tenho dúvidas que encantou e satisfez o muito público feminino que se deslocou aos cinemas. Agora eu preciso de mais. Mais substância e menos pretensiosismo. Ainda assim, admito que para o que habitualmente a comédia romântica nos oferece, "One Day" sempre tem estilo e frescura, uma banda sonora lindíssima de Rachel Portman que nos transporta para outro mundo e uma história de amor que sempre dá para nos fazer sonhar. Se não tivermos amanhã, ao menos tivemos o dia de hoje. E que diferença, às vezes, um dia faz. Que o digam Emma e Dex.

Nota Final:
B-/C+

Informação Adicional:
Elenco: Anne Hathaway, Jim Sturgess, Patricia Clarkson, Rafe Spall, Romola Garai, Ken Stott
Realização: Lone Scherfig
Argumento: David Nicholls
Fotografia: Benôit Delhomme
Banda Sonora: Rachel Portman
Ano: 2011

Trailer:




sábado, 15 de outubro de 2011

CONTAGION (2011)






"It's figuring us out faster than we're figuring it out."

Começo por dizer que Steven Soderbergh é dos realizadores americanos que mais admiro. Só ele para construir uma carreira que alterna entre filmes de largo orçamento, produzidos pelos grandes estúdios de Hollywood, e pelos pequenos filmes independentes que, numa fase inicial, lhe ditaram o futuro na profissão. Durante uns tempos, Soderbergh tentou conciliar ambos, realizando dois filmes no espaço de um ano e lançando-os quase ao mesmo tempo. De repente, cansou-se e parou. E o mundo do cinema despedia-se não só de um dos seus autores mais profícuos, mas também um dos mais irreverentes e talentosos. E se bem que ele nunca há de voltar aos níveis de genialidade atingidos com o seu auspicioso início "Sex, Lies and Videotape", vencedor da Palma de Ouro em Cannes em 1998, é sempre bom tê-lo de volta ao que melhor faz: filmes. E 2011 oferece-nos dois filmes dele, ainda por cima.

O primeiro desses a ser lançado é este "CONTAGION", que reúne um elenco impressionante de brilhantes e talentosos actores para contar a história de como uma simples infecção viral pode provocar, de forma estrondosa, uma revolução no mundo inteiro, na tentativa de mostrar que, ao contrário do que muitos pensam, o real perigo do fim do mundo pode não estar em terramotos ou dilúvios ou outros desastres naturais, mas sim numa pandemia microbiológica multirresistente, capaz de ceifar a vida a milhões de pessoas enquanto semeia o pânico e a guerra entre pessoas, entre nações, entre o mundo.



A narrativa de "Contagion" é algo que já foi contado várias vezes, por diversas perspectivas, mas sempre da mesma forma. O que faz o filme de Soderbergh tão diferente dos outros (para melhor) é o facto de abordar a situação do ponto de vista de cada personagem, da forma menos sensacionalista e mais realista possível. O filme parece funcionar até como uma espécie de documentário, tal é a sua vontade de ser levado a sério e a sua precisão a nível científico (algo que é de louvar). Comporta-se como um thriller adulto que tenta fazer passar uma amálgama de mensagens, algumas políticas, outras sociais, acerca da forma como a sociedade actual reage a este tipo de acontecimento. Procura ser minimamente assustador e impressionante. Contudo... a não ser que seja um verdadeiro misofóbico (que tem horror a germes) - que eu sou, já agora - penso que não deve recear ver este filme. Se os germes o assustam... Bem, prepare-se. O filme não ajuda nada.



O filme abre então com a chegada de Beth Emhoff (Gwyneth Paltrow) a casa, onde encontra o seu marido Mitch (Matt Damon) e o seu filho Clark, já visivelmente debilitada e doente depois de uma visita de negócios a Hong Kong. A sua doença, aparentemente, não é um caso isolado, pois acontece o mesmo a uma top model ucraniana de regresso a Londres, um empregado de mesa chinês e um homem de negócios japonês. Partindo destas primeiras pessoas infectadas, a película observa o desenrolar cronológico da progressão do vírus, apresentando-nos, além de mais indivíduos que contraem a doença, o grupo de pessoas responsáveis por parar a proliferação da infecção, entre eles médicos - Dr. Orantes, especialista da OMS (Marion Cotillard), Dr. Mears (Kate Winslet), Dr. Hextall (Jennifer Ehle), Dr. Eisenberg (Demetri Martin), Dr. Sussman (Elliot Gould) e Dr. Cheever (Lawrence Fishburne), responsáveis do CDC - e figuras governamentais (Bryan Cranston, Enrico Colantoni) e ainda nos introduz uma questão pertinente sob a forma de Alan Krumwiede (Jude Law), um oportunista blogger australiano que pretende lucrar com a crise e que cria teorias da conspiração em que menciona documentos que teriam sido ocultados pelo governo acerca do vírus e do seu tratamento.



Algo a admirar em "Contagion" é a forma surpreendentemente vivaz e empolgante com que se desenrola o filme, não deixando lugar para o aborrecimento durante as suas quase duas horas de duração. Também há que elogiar Soderbergh por nunca deixar que a história de uma das personagens se sobreponha às outras, dando tempo a todas sem nunca permitir que uma ganhe proeminência. Claro que o elenco é seu aliado, pois tanta gente com talento nunca poderia dar mau resultado. Não há um ponto fraco, tal como não há (por razões óbvias, como já expliquei) ninguém que se destaque. Scott Z. Burns e Steven Soderbergh mantêm o argumento o mais simples, plausível e directo possível, sendo que o único detalhe que me recorde incomodar-me é o facto de praticamente nenhuma das personagens ter grande profundidade - algo que neste tipo de filme não choca ninguém também, por isso penso que esse será um mal menor. A banda sonora electrizante de Cliff Martinez, a edição impecável de Stephen Mirrione e a fotografia sumptuosa - a cargo do próprio Soderbergh - ajudam a manter as coisas interessantes.



O final deixa as coisas irremediavelmente resolvidas e, com tantas personagens para nos despedirmos e vermos a sua história ser encerrada, permite-se entrar em alguns clichés desnecessários e que teriam ficado melhor fora do ecrã mas, ainda assim, é um dos filmes imperdíveis do ano e uma fonte de entretenimento garantido, mais não seja porque o seu objectivo é maior do que contar uma simples história: "Contagion" tenta colocar-nos a discutir e a questionar tudo aquilo que nos foi mostrado.


Nota Final:
B

Informação Adicional:

Realização: Steven Soderbergh
Argumento: Scott Z. Burns
Elenco: Marion Cotillard, Bryan Cranston, Matt Damon, Jennifer Ehle, Lawrence Fishburne, Jude Law, Demetri Martin, Gwyneth Paltrow, Kate Winslet
Fotografia: Steven Soderbergh
Banda Sonora: Cliff Martinez
Ano: 2011


Trailer:

[ESPECIAL] CONTAGION

Na Estação de Metro do Cais do Sodré, o Filme da Semana no Dial P for Popcorn, Contagion (cuja crónica publicaremos aqui em breve), teve direito a uma publicidade muito especial e bastante apropriada à temática do filme. Uma ideia original e inteligente, que certamente vai chamar até ao cinema publico que, de outro modo, passaria ao lado deste filme.




Relembro que esta ideia também foi explorada noutras metrópoles, como é exemplo este billboard no Canadá.

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

SANGUE DO MEU SANGUE (2011)





Não saí da sala de cinema rendido. Saí satisfeito, contente pelo investimento num bilhete de cinema (cada vez mais caro!) para um filme português, mas não saí fascinado e extasiado como a grande maioria dos críticos de cinema em Portugal. No entanto, percebo-os. Sangue do Meu Sangue será, muito provavelmente, o melhor filme português dos últimos 50 anos e, seguramente, um dos melhores momentos da nossa (infezlimente, paupérrima) indústria cinematográfica. Se existisse, no nosso blogue, uma nota exclusiva para filmes portugueses, não teria dúvidas em lhe atribuir o valor mais alto.


Como já disse, Sangue do Meu Sangue é um bom filme. Começo por vos falar de Rita Blanco, o melhor entre o melhor. Uma interpretação arrebatadora, uma prova do enorme valor como actriz e mulher. Sem ela, sem a sua interpretação, sem a sua entrega à história, certamente Sangue do Meu Sangue passaria ao lado de muito boa gente. Mas há mais interpretações que merecem o meu destaque. Anabela Moreira, no papel de tia solteirona e abandonada, a representar o triste fim de uma mulher que encalha num beco sem saída e perde a esperança de ser feliz, e ainda Nuno Lopes (o herdeiro natural do trono que actualmente Miguel Guilherme ocupa como melhor actor português dos últimos anos) vive a personagem de um gangster e comprova que é impossível representar mal.

Mas Sangue do Meu Sangue tem mais. Tem um dedo tão marcante de João Canijo, que o torna diferente, que o torna mais especial. Tem as conversas paralelas. Tem uma câmara que se movimenta dentro das cenas como se do próprio espectador se tratasse, uma câmara que permite viver o ambiente da família que faz a história deste filme. E, por fim, Sangue do Meu Sangue, retrata aquilo que é o Portugal dos nossos dias. O Portugal da crise económica, familiar e amorosa. O Portugal que vive das migalhas, que alimenta sonhos de um amanhã melhor e que tenta, a todo o custo, sair do buraco em que foi enfiado.


O que gostei menos em Sangue do Meu Sangue? Começo por esclarecer que adorei os diálogos e as personagens. Foi uma criação inteligente, não só da parte de Canijo como de todo o elenco (que participou activamente na criação do argumento). No entanto, achei (pessoalmente) uma história demasiado previsível para poder classificar o seu argumento de Brilhante. A história deste filme já foi contada de muitas formas (algumas vezes melhor, muitas delas pior) e acaba por não trazer nada de realmente novo e diferente àquilo que é o cinema. Pelo menos o cinema internacional, porque em Portugal é claro que se demarca e se distingue (por uma grande margem) de quase tudo o que se tem feito nos últimos anos. Mas sabe a pouco. Sangue do Meu Sangue ficou muito perto de ser um filme estupendo e se posicionar lado a lado com os melhores filmes de lá de fora. Olhando-o como um crítico Português, acho que Sangue do Meu Sangue é um marco. Olhando-o como um crítico de estrangeiro, acho Sangue do Meu Sangue um bom e interessante filme.

Se merecesse que o espectador o veja no cinema e ajude João Canijo a continuar a fazer bom cinema? Totalmente. Um conselho: Aproveite para investir o seu orçamento cinematográfico do mês de Outubro neste filme. Ganha você, ganha João Canijo e ganha o Cinema Português. Desta vez vale bem a pena.


Nota Final:
B+


Trailer:





Informação Adicional:

Realização:
João Canijo
Argumento:
João Canijo e Elenco
Ano: 2011
Duração:
140 minutos

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

[POSTER] CONCRETE ISLAND



Concrete Island, uma das mais aguardadas produções de Hollywood, já tem o primeiro poster oficial! Falo-vos, claro, do filme que voltará a reunir Christian Bale, Brad Anderson e Scott Kosar, o trio que criou um dos mais marcantes filmes da década passada, The Machinist!
E, pelas informações que vão sendo veiculadas (quer pela produtora Filmax, quer pelos jornalistas) teremos mais um filme psicótico e alucinante, a obrigar Christian Bale a mais uma estrondosa entrega pessoal e a um papel perturbador. Christian Bale será Robert Maitland, um bem sucedido arquitecto, que após um acidente de carro desperta num mundo paralelo, um local estranho e inóspito, onde apenas o mais forte sobrevive. Para ver (em princípio), em 2013.

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Trailer de YOUNG ADULT, de Jason Reitman


A pergunta que aqui vos deixo é somente a seguinte: Jason Reitman e Diablo Cody juntos novamente. É possível não gostar?


terça-feira, 11 de outubro de 2011

A Morte da 7ª Arte (Versão Sofia Coppola)

"O Dial P For Popcorn tem o prazer de vos apresentar o nosso mais recente colaborador! Axel Ferreira, nosso colega e amigo, aceitou o convite para a elaboração de uma crónica quinzenal. Com uma visão peculiar e distinta da realidade cinematográfica, A Morte da 7.ª Arte deixa apenas uma promessa: Ninguém a poderá evitar."


Erudição Misógina


Adiam-se as forças, adiam-se as vontades, adia-se a vida. Esta é mais ou menos a maneira contemporânea de viver. Uma atitude que nos leva a não reconhecer erros nos paradigmas que nos são apresentados. Mas começar uma nova temporada de morte assim até sabe mal. Por isso há que dizer para quem quiser ler, sendo o cinema algo de mundialmente aceite, é o mais poderoso perpetuador da misoginia. E eu estou a incluir a própria igreja católica nos meus cálculos conceptuais. Pelo simples facto de esta última ser um meio de vida cada vez menos aceite e a partes largas ignorado pela larga maioria dos próprios católicos. Seria fácil dizer-vos isto e pouco mais, mas escrever apenas um parágrafo é algo de muita preguiça.


É factual que a maioria dos filmes é protagonizada por homens, mas isso é dizer pouco. Passemos apenas àquela maquia protagonizada por mulheres, e já aqui ficamos sem a larga maioria dos melhores filmes de sempre. Só dando o exemplo dos filmes do Stanley Kubrick, estes são quase exclusivamente sobre homens e como eles dominam mal o mundo e quando mete mulheres é só com o pretexto de uma obsessão sexual. Começando pelo clássico, quando antigamente tínhamos uma mulher como actriz principal era sempre uma princesa à espera do príncipe encantado, seja ele figurativo ou não. O paradigma deste tipo de filmes é o clássico da Disney, onde a mulher é retratada como algo indefeso que precisa de ser protegido e salvo com a sua meia-laranja de colans para ficar bem. Isto é o que mostramos às nossas crianças, aquilo que lhe mostramos como filmes perfeitos e saudáveis. As raparigas de tenra idade adoram ver a pequena sereia e a bela adormecida e querem ser princesas como elas, e quem as pode culpar se é o que lhe ensinam a querer ser de pequenas? Há que agradecer ao Walt o grande número de adolescentes à procura de um bom namorado robusto bastante mais velho. Ainda há uma grande tipologia de filmes mais actuais live action que exploram isto de uma maneira um pouco mais moderna, fazendo com que a miúda encontre um rapaz porreiro que faz algo estúpido, dá umas voltas com mais três ou quatro e depois volta ao original, o seu extremamente verdadeiro amor, e faz isto tudo sem perder a sua inocência original (há de facto que admirar a maneira como os argumentistas dão a volta às ideias). Não refiro o nome desses filmes por incapacidade de me lembrar dos nomes mas basta pensarem em meninas que com menos de vinte anos que andaram por aí a fazer filmes e às vezes também fazem música ou são presas por conduzir bêbadas ou são gémeas. Continuando a nossa odisseia, depois dos filmes onde a mulher é admiravelmente frágil e pura temos os filmes onde a mulher é demasiado estúpida para se livrar dos seus próprios problemas e fazer alguma coisa de jeito durante o filme inteiro (e aqui temos o grande Gone With the Wind onde resplandece o mais elaborado esquema do preconceito da mente feminina). Mas reparem que há exemplos extensos disto mesmo, com uma grande participação por parte do Almodovar que ainda não conseguiu perdoar as mulheres por existirem, e até existem por parte do Manoel de Oliveira com o seu Singularidades de uma Rapariga Loira. E já nem falo de filmes para necrotizar o próprio cérebro como é o caso do tal diário da gorda que tinha dois amores. Mas para culminar o excelente percurso temos o mais actual personagem feminino, a cabra homicida. O óbvio motivo seria o de ter uma mulher bastante jeitosa a dar pontapés e disparar contra uns tipos, algo que foi levado a um outro nível com o Kill Bill. E mesmo neste a mulher não é retratada como uma heroína, mas como um ser que apenas vive para a vingança. E é esta a base para o pensamento cinematográfico sobre a mulher, que só é capaz de grandes feitos quando é levada por sentimentos extremos como o rapto ou morte do filho ou coisa parecida (Changeling, Dancer In the Dark, Belleville Rendez-Vous, Flightplan e aquele outro filme que mete alienígenas também com esta tipa que já disse que só faz papéis que satisfaçam o seu standard feminista), nunca como um herói com um sentido de dever. E este pensamento é tão primitivo como o próprio mundo e actualmente aceite, quando assim dito, como completamente errado. Mas não é levado apenas neste sentido, tal como no Ran do grande Kurosawa, ela pode ser apenas um ardil manipulador que estraga todos os planos existentes e imagináveis, mas mais uma vez apenas por vingança.


Calma, ainda há esperança. Monster, duas lésbicas assassinas. Mary Poppins, como é uma ama tinha mesmo de ser mulher. Mary Reilly, sempre tão indefesa e cheia de pesadelos que até o ignóbil Mr. Hyde tem pena dela e a salva. Sister Act, mulher indefesa a fugir do ex-namorado super idiota (nunca percebi, nem quando era pequeno, era como será possível uma personagem destas ter estado com aquele tipo desde o início). Tomb Rider ou o Salt, uma desculpa para pôr uma gaja a dar pontapés e o último até tinha sido imaginado para o Brad Pitt. The Devil Wears Prada, bem se vais fazer um filme sobre mulheres no poder mais vale que meta roupa e coisas tais que elas saibam fazer. Princess Mononoke, selvagem e homicida que mesmo assim tem que ser salva por um homem. Natural Born Killers, cabra assassina mesmo vil que mesmo assim é salva pelo homem. Ghost In the Shell, até que é heroína mas afinal é um robô. Black Swam, mulher tão envolvida nos seus próprios problemas e tão estúpida que acaba por se matar. The Hours, epidemia da mulher indefesa, cheia de problemas e suicida repartida por três papeis diferentes (facilita bastante a vida de quem vê). Mrs. Doubtfire ou Tootsie, afinal é um homem. Todos os filmes onde a Marylin Monroe entrou, em que reencarna um papel de mulher indefesa que gosta de ir para a cama com muitas pessoas mas que é muito ingénua e inocente. La Vie en Rose, se vamos fazer um filme sobre uma mulher que fez alguma coisa da vida ao menos que seja biográfico, mesmo assim mais vale que esteja embriagada de homens e analgésicos. Até a Sofia Coppola resolveu fazer um filme onde as mulheres são todas suicidas porque estão cheias de problemas e são tão indefesas e agora até prefere fazer filmes sobre homens. Precious, mulher extremamente deformada com mais problemas psicológicos e mais indefesa que qualquer outra. Psycho, afinal morre e nem sequer é a personagem principal, de volta aos homens. Se começarmos com as séries então não acabamos mais, Nikita e V, uma desculpa para pontapés e uma cabra homicida. Até havia um manga japonês depois transformado em anime, chamado Elfen Lied, que exemplifica perfeitamente este problema de as mulheres sexis terem muitos problemas em não matar ninguém. Se alguém se der ao trabalho podem ir ver a primeira cena ao youtube, tenho a certeza que vão ficar maravilhados. Spirited Away e Fargo, bem, nestes acho que não tenho nada a dizer.


O salto ao próximo nível está próximo, a mulher como uma personagem principal é algo que ainda está a ser explorado e que vai surgir cada vez mais mas nunca pelo mainstream. O Trier é um explorador nato deste tipo de papéis e curiosamente é o único perseguido pelos grupos feministas que ainda não perceberam que politicamente incorrecto e misoginia são dois conceitos diferentes. Vendo o Anticristo, mesmo que seja uma sádica homicida é-o na exploração do papel da mulher moderna na sociedade onde ainda é interpretada como o pecado original. Mas não é isto que me interessa dizer-vos, o que eu espero que percebam é que quando alguém tenta fazer algo com qualidade sobre seja o que for, é perseguido mas o que é mainstream nunca é. O porquê não existe a não ser pela cegueira de pensar que, ou não são filmes sérios (primeiro erro, porque todos os filmes são sérios na perpetuação do preconceito), ou porque é aquilo que estamos habituados a ver desde os primeiros passos com a Disney e agora a Dreamworks. O que eu quero dizer é que os grandes culpados por isto continuar a acontecer somos nós que continuamos a ver todos estes filmes e nem sequer nos apercebemos que isto acontece. Não questionamos os paradigmas que nos foram apresentados desde que nascemos, não percebemos que aquilo em que nós acreditamos, algo tão pequeno como igualdade entre sexos, é posto em causa todos os dias e de uma maneira tão sistemática que até nós acabamos por integrar este dogma no nosso pensamento de maneira inconsciente. A maioria das diferenças que achamos que existem entre homens e mulheres foram coisas que vimos no cinema desde que o primeiro atrasado no mundo disse que os homens são de Marte e as mulheres de Vénus. Este acto de não pensar e questionar é anti-humano mas não é, e nunca será, anti-natural.

PS: Existe um tipo de filme em que as mulheres são quase invariavelmente as personagens principais (salvaguardando excepções óbvias). A parte menos espectacular é que são os filmes pornográficos.


Axel Ferreira

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Julie Andrews celebra 76 anos!


Até nem sou muito de participar em postagens colectivas, mas esta proposta do Grupo de Blogues de Cinema Clássico era impossível de recusar, a propósito do 76º aniversário (celebrado a 1 de Outubro, bem sei, mas foi esta a data combinada) de uma das maiores actrizes da história do cinema: Julie Andrews e uma das minhas actrizes e personalidades favoritas de Hollywood.



A propósito do tema deixo-vos ficar, para aguçar o apetite (também vos aconselho a visitar o sítio do Grupo de Blogues, com muitos outros artigos formidáveis aí a vir sobre a actriz, a sua vida e a sua carreira), este brilhante artigo de Nathaniel Rogers no The Film Experience a comemorar o ano transacto o 75º aniversário da actriz.


Bem, mas onde estava? Pois, em Julie Andrews. Vencedora de múltiplos prémios, entre eles o BAFTA, o Globo de Ouro e o Óscar pela sua inolvidável interpretação em "Mary Poppins", um filme que então, hoje e sempre encantará os mais pequenos e fará também as delícias dos mais crescidos, que com ternura e afecto e muito charme faz passar mensagens e lições morais importantes, originou o papel principal de "My Fair Lady" na Broadway - com enorme sucesso e aclamação crítica, diga-se - que, infelizmente, não pode representar no grande ecrã porque na altura os estúdios pretendiam um sucesso imediato e então optaram pela mais famosa actriz da altura, Audrey Hepburn que, curiosamente, nem sequer foi nomeada por esse papel, no ano que viu precisamente Julie Andrews ser coroada com a vitória nos Óscares. Estávamos em 1965 e Hollywood nunca mais iria duvidar de Julie Andrews.


Isto porque a seguir viria aquele que bateria na época todos os recordes de bilheteira e consagraria Julie Andrews no panteão das grandes estrelas de cinema: "The Sound of Music". Nova nomeação para os Óscares e uma legião de milhões de fãs, encantados com o filme e com a actriz, se seguiria.


Mas Andrews não iria descansar mesmo depois de laureada, aclamada e aplaudida por todos. Continua em grande esta década de êxito com "Thoroughly Modern Millie" (o filme com maior receita de bilheteira dos estúdios Universal então), originando o papel de Guinevere na versão original de "Camelot" e com uma colaboração bem sucedida - mas nunca mais repetida, por diferença de perspectivas - com Alfred Hitchcock em "Torn Curtain"

Julie Andrews terminaria a década de 1960 como a maior actriz em Hollywood, que tinha dado à Disney ("Mary Poppins"), à 20th Century Fox ("The Sound of Music") e à Universal ("Thoroughly Modern Millie") os seus maiores êxitos da altura, que tinha protagonizado os dois filmes com maior receita de bilheteira de sempre ("The Sound of Music" e "Mary Poppins", sem ajuste do preço do bilhete obviamente), que tinha protagonizado o maior sucesso de sempre da Broadway ("My Fair Lady") e que tinha estrelado o maior sucesso televisivo da época (o telefilme "Cinderella", pelo qual foi nomeada para os Emmys). Tudo isto apenas aos 34 anos de idade.


Que ela não tenha parado aí é o que faz de Julie Andrews uma mulher, uma actriz e uma estrela tão especial. Ela que continuou a desafiar-se ao longo dos tempos (como com "S.O.B."), que ousou fazer regressar o musical, um dos mais gloriosos géneros cinematográficos da era de Ouro e que se encontrava ostracizado nos anos 80 ("Victor/Victoria", que lhe valeu mais uma nomeação para os Óscares), que procurou sempre novas oportunidades (como a sua série de variedades na ABC, "The Julie Andrews Hour", vencedora de sete Emmys), que nunca esqueceu o bichinho pelo teatro (tendo voltado à Broadway com "Victor/Victoria", adaptando o seu filme - e do seu marido Blake Edwards - para peça) e que nunca esmoreceu com as dificuldades (perdeu a sua voz de canto em 1997, após uma cirurgia para remoção de nódulos nas cordas vocais). E ela também que se soube adaptar em Hollywood e arranjar forma de ganhar uma nova legião de fãs com as suas aparições em "Shrek" e "The Princess Diaries", prova que é realmente impossível, no fim de contas, não nos apaixonarmos por ela.


Esta, meus senhores e minhas senhoras, é Julie Andrews. E eu nunca me vou esquecer que foi esta enorme senhora, belíssima mulher, extraordinária e versátil actriz e estonteante estrela que ofereceu ao mundo momentos tão inesquecíveis quanto estes três que decidi ressalvar abaixo:




Feliz aniversário, Julie! 
E que pensam vocês de Julie Andrews?