Dial P for Popcorn: fevereiro 2012

quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Personagens do Cinema - Annie Hall


Dei por mim a pensar que raramente escolho mulheres para fazerem parte desta rubrica. E que a grande parte das escolhidas até este mês (senão todas) foram da exclusiva autoria do Jorge. Por isso, este mês escolho uma mulher. E confesso-vos que a escolha foi difícil. Basta olhar para os melhores filmes do site IMDB.COM (que muitos "críticos" gostam de desprestigiar) e facilmente se percebe a enorme representatividade do sexo masculino no protagonismo desses filmes. É um facto. Por isso demorei-me na escolha. Fácil, seria pegar numa interpretação da Meryl Streep. Mas como já foi bastante dissecada na Maratona Meryl Streep que o Jorge fez no blogue há uns meses, optei por elogiar Woody Allen através daquela que foi a maior musa de toda a sua carreira, num dos mais aclamados e adorados romances da história.


Diane Keaton, em início de carreira, personificou a mulher que fez perder o juízo de um Woody Allen que se confundiu com o comediante Alvy Singer (personagem que encarna neste filme), um homem maduro, divorciado, com uma personalidade complexa (neurótico, obsessivo, impaciente, impulsivo). Todo o filme é marcado pela evolução de uma relação difícil, que se torna difícil pelas constante turbulências que os dois criam, que consomem o coração de Woody Allen. Annie é jovem, livre e com uma personalidade forte. É a típica jovem que, nos anos 70, caminha na dúbia fronteira entre o tradicionalismo e a irreverência. Sabe o que quer e sabe quem procura. E é delicioso todo o texto que se constrói, todas as ideias que se partilham e a forma como Woody Allen transforma uma mulher num marco, e a imortaliza pela sua escrita e pela forma única como nos fala de amor.

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Oscars 2012 - Um breve comentário.



Ao contrário do ano passado, desta vez não estive com paciência para acompanhar a cerimónia. Estou farto do exibicionismo e da histeria do povo americano. No entanto, gosto sempre de dizer algo sobre aquilo que realmente interessa: os vencedores.


Nas minhas categorias favoritas (Melhor Documentário e Melhor Filme Estrangeiro), ainda não consegui ver nenhum dos nomeados deste ano. São duas categorias mais secundárias e por isso menos sujeitas às pressões externas. É onde a Academia mais vezes acerta. Quanto ao Melhor Filme estou contente. Se tivesse que escolher outro vencedor, entregaria de barato a vitória aos Descendentes, filme que me encantou este ano. No Melhor Actor, justo. Melhor Actriz, sem espinhas. Meryl Streep foi a melhor interpretação que vi, até agora, do Ano 2011.


Mas a minha grande alegria da noite vai para a estatueta que foi entregue a Christopher Plummer. Felizmente que se fez justiça. Uma interpretação enorme, num filme completamente apaixonante (muito provavelmente, o meu favorito de 2011). Nota ainda para o prémio de Melhor Realizador, que gostaria que tivesse sido entregue a Alexander Payne (a forma como provou que o melodrama nos pode surpreender foi mesmo cativante) e para O Melhor Argumento Original, que não esqueceu o brilhantismo de Woody Allen.


P.S. - Tanta euforia à volta do que fez Sasha Baron Cohen é a prova de que o formato dos Oscars deve continuar assim por muitos anos. Ser palhaço dá os seus frutos. E não é só em Portugal.

Tudo o que tenho a dizer da cerimónia dos Óscares 2012...


É só e apenas isto. Mesmo eu preferindo que ganhasse Viola Davis, não posso deixar de ficar extasiado com a vitória da mulher mais admirada do mundo. 

[Fonte: IMDb]


Meryl, és única. És grande. Finalmente aí tens o terceiro. E, tal como em 1983, estavas de dourado e de braço dado com o Don. Já estava destinado.


Amanhã volto com uma apreciação mais a fundo da cerimónia, de Billy Crystal e dos vencedores e vencidos. A ver se encerramos a temporada de 2011-2012 em grande. É que os filmes do novo ano já estão aí à porta.

Óscares 2012 - Vencedores (e Previsões)




Estamos a poucas horas do início de mais uma cerimónia dos Óscares. Este ano não há liveblog aqui no Dial P For Popcorn, podendo acompanhar a nossa opinião na nossa conta do Twitter. Para já, deixo-vos com as minhas previsões dos vencedores (aviso já que não sou fonte consistente para aqueles que gostam de fazer apostas, porque tanto tenho um ano de muito acerto como erro muito; sou um verdadeiro guru iô-iô). Se estiverem interessados na ordem pela qual os prémios são distribuídos, podem consultá-lo AQUI.

Vou acabar por ter uma noite bastante satisfatória, porque pela primeira vez em muito tempo não estou de costas voltadas com o vencedor de Melhor Filme (não acho que “The Artist” seja o melhor dos nomeados, mas, no fim de contas, o meu favorito – “Moneyball” – nunca foi realisticamente previsto como vencedor, daí que aprecio a vitória da bela película a preto e branco), qualquer uma que vença Melhor Actriz me vai deixar contente (seja ela Meryl Streep, Viola Davis ou Michelle Williams) e vou adorar o discurso de Melhor Actor, seja ele proferido por Dujardin, Clooney ou Pitt.

Decidi arriscar um pouco nalgumas categorias, porque afinal, qual é a piada de prever os Óscares se não apostarmos nalgumas decisões polémicas? Na de Argumento Original, porque acho que o estatuto de favorito de “The Artist” permite, tal como a “The King’s Speech” ou “The Hurt Locker” em anos passados, bater a escolha consensual dos prémios dos críticos, Globos e afins. Ainda assim, não consigo perceber como é que os votantes conseguem resistir a votar em Woody Allen pelo seu melhor filme em anos.

Em Guarda-Roupa, a corrida a cinco está a tornar difícil perceber qual o vencedor. “The Artist” poderá facilmente sair vencedor aqui, sendo o favorito a ganhar Melhor Filme, mas “Jane Eyre” é a escolha sensata da categoria. Cuidado ainda com Sandy Powell (“Hugo”) que pode muito bem também triunfar, ou “Anonymous”, porque não há coisa que esta categoria ame mais que realeza.

Em Edição apostei em “The Artist” também porque é o favorito para Melhor Filme e nesta categoria, mais do que todas as outras, o vencedor leva quase sempre os dois prémios. Contudo, não esquecer que defronta Thelma Schoonmaker (“Hugo”), uma das pessoas mais queridas pela indústria cinematográfica.

Filme Estrangeiro é outra categoria difícil de prever. "A Separation" é sem dúvida um enorme filme, mas nesta categoria muitas vezes a qualidade - e mesmo a quantidade de prémios vencida - pouco significa. E depois nos nomeados temos um filme polaco sobre o Holocausto, que tresanda a Óscar. Não sei. Aposto no seguro ("A Separation") mas temo que o pior possa acontecer.

As categorias de Som, finalmente, parecem ter sempre tendência para não irem ambas para o mesmo filme. Prevejo uma divisão entre "Hugo" e "War Horse", mas não sei quem fica com qual. Se "Hugo" for verdadeiramente adorado, ganha as duas. Não sei que decidir aqui. Vou com o meu instinto.


Acerto nas previsões: 15 | 24 (63%) sem alternativas, 23 | 24 (96%) com alternativas

Melhor Filme
“The Artist”

Melhor Realizador
Michel Hazanavicius, “The Artist”

Melhor Actor
Jean Dujardin, “The Artist”

Melhor Actriz
Viola Davis, “The Help”
Meryl Streep, “The Iron Lady”

Melhor Actor Secundário
Christopher Plummer, “Beginners”

Melhor Actriz Secundária
Octavia Spencer, “The Help”

Melhor Argumento Original
“The Artist”
“Midnight in Paris”

Melhor Argumento Adaptado
“The Descendants”

Melhor Fotografia
Robert Richardson, “Hugo”

Melhor Direcção Artística
“Hugo”

Melhor Maquilhagem
“The Iron Lady”

Melhor Guarda-Roupa
“Jane Eyre”
“The Artist”

Melhor Edição
“The Artist”
(“Hugo”)
"The Girl with the Dragon Tattoo"

Melhor Banda Sonora Original
“The Artist”

Melhor Canção Original
“Man or Muppet” – “The Muppets”

Melhor Edição de Som
“Hugo”

Melhor Mistura de Som
“War Horse”
“Hugo”

Melhores Efeitos Visuais
“Rise of the Planet of the Apes”
“Hugo”

Melhor Filme Animado
“Rango”

Melhor Documentário
“Hell and Back Again”
“Undefeated”

Melhor Filme Estrangeiro
“A Separation”

Melhor Curta-Metragem, Documental
“Saving Face”

Melhor Curta-Metragem, Animação
“A Morning Stroll”
“The Fantastic Flying Books of Mr. Morris Lessmore”

Melhor Curta-Metragem
“Tuba Atlantic”
“The Shore”


sábado, 25 de fevereiro de 2012

HUGO (2011)



Provavelmente não estava com a melhor das disposições quando vi este filme. Hugo não é um mau filme. Mas também não me empolgou. É uma história bonita, óptima para mostrar às crianças, mas acho que, para mim, fica por aí. Não está no melhor que vi este ano e fiquei um pouco desiludido. No combate directo com o Artista, para os prémios finais da Academia, fica claramente atrás. E é também facilmente ultrapassado pelo óptimo The Descendants.


Hugo (Asa Butterfield) é uma criança orfã que vive sozinho numa estação da Paris da década de 30, dividindo o seu dia-a-dia entre os vários relógios que mantém a funcionar irrepreensivelmente e a procura de materiais para concertar uma misteriosa máquina (com uma peculiar forma humana) que lhe foi oferecida pelo seu pai, pouco tempo antes da sua morte. Hugo trabalha pela paixão que tem pelas máquinas, característica que herdou do seu pai, e com o objectivo de descobrir qual a mensagem que a mesma esconde. Um dos locais que frequenta com regularidade na "sua estação", é a loja relógios e raridades de Georges Méliès (Ben Kingsley), onde sorrateiramente vai roubando algumas peças importantes para a reconstrução da sua máquina. Até que um dia é apanhado em flagrante por Georges que se vinga confiscando-lhe o precioso caderno mágico onde Hugo apontara todas as alterações necessárias para o funcionamento das suas máquinas.


Decidido em recuperar o seu caderno, Hugo segue Georges até casa e acaba por conhecer Isabelle (Chloë Grace Moretz), uma jovem curiosa e perspicaz que vive sob a tutela de Georges e que rapidamente se transforma na sua grande companheira de aventuras. Juntos exploram todos os recantos da estação e a sua curiosidade leva-os a descobrir um fantástico segredo, que para sempre irá mudar as suas vidas e a daqueles que os rodeiam.


Nota Final:
B-


Trailer:




Informação Adicional:
Realização: Martin Scorsese
Argumento: John Logan (screenplay), Brian Selznick (book)
Ano: 2011
Duração: 126 minutos.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Círculo de Críticos Online Portugueses em funcionamento




Entrou em funções no passado dia 15 de Fevereiro o Círculo de Críticos Online Portugueses, uma ideia implementada em Portugal pelo criador do blogue Split Screen, Tiago Ramos, com base no original brasileiro (a Liga dos Blogues Cinematográficos, no qual ele também participa). 

Dos membros fundadores deste grupo fazem parte nomes incontornáveis da nossa blogosfera, contando com - além do já mencionado Tiago Ramos - o Pedro Ponte e o Gonçalo Trindade (Ante-Cinema), o Nuno Reis (Antestreia), o Samuel Andrade (Keyzer Soze's Place), a Catarina D'Oliveira (Close-Up), a Inês Moreira Santos (Espalha Factos), o João Pinto (Portal Cinema), o Miguel Ferreira (A Última Sessão) e os vossos dois co-criadores aqui do Dial P For Popcorn.

O objectivo do projecto, nas palavras do seu fundador-mor: "O Círculo de Críticos Online Portugueses (CCOP) é um grupo seleccionado de críticos online de cinema portugueses, cuja acção se centra essencialmente na classificação dos filmes estreados mensalmente nas salas de cinema portuguesas, de forma a produzir um conjunto de tops mensais, com oportunos dados estatísticos. O CCOP poderá dedicar-se ainda à elaboração de tops de temáticas especiais (décadas, realizadores, géneros) e um prémio anual (cujo nome será posteriormente definido) dedicado aos melhores filmes do ano. Este projecto nasceu em colaboração com o projecto, de origem brasileira, Liga dos Blogues Cinematográficos."

Para já, podem consultar o primeiro top mensal, que diz respeito ao passado mês de Janeiro, AQUI.

sábado, 18 de fevereiro de 2012

REALIZADORES: METROPOLIS (1927)



Regressa este mês a minha recente aposta de crónicas mensais. Esteve ausente nos últimos dois meses, por diversos motivos que atrasaram também a actualização do blogue, mas a partir de agora espero conseguir realizar a crónica com a pontualidade com que actualizo as restantes crónicas mensais. Pensei em repetir o realizador da crónica anterior, mas preferi variar o leque de estrelas que por aqui vão passar ao longo dos próximos meses. Depois de me apaixonar pelo M, resolvi que Fritz Lang deveria estar entre nós o mais rapidamente possível. Escolhi então um dos seus mais conceituados filmes, Metropolis. A obra de um visionário, de um homem que viveu à frente do seu tempo e que percebeu, com uma astúcia fabulosa, aqueles que seriam um verdadeiros problemas da sociedade moderna, da civilização do Século XXI.


Metropolis é uma cidade futurista. Aquilo que Fritz Lang e Thea von Harbou idealizaram como o futuro. E neste futuro, o povo trabalha, escravizado, para sustentar o ócio e os caprichos de uma minoria escolhida por sangue e linhagem. Sem direito a verem a luz do dia, trabalhando arduamente nas profundezas da terra, o povo cumpre ordens e vive uma existência triste, cinzenta e desgraçada. Tudo muda quando Freder (Gustav Fröhlich), filho de Joh Fredersen, o abastado dono da Metropolis, conhece a realidade que durante toda a sua vida lhe foi escondida e ludibriada pelo pai: os homens, mulheres e crianças, as vidas que, no submundo, trabalham até à exaustão, para que o mundo soberano possa estar feliz, possa gozar os bons prazeres da vida e aproveitar as regalias do seu estatuto.


Decidido a mudar o curso da história, a quebrar as barreiras que separam os privilegiados dos condenados, Metropolis faz-nos uma viagem à essência do ser humano. Aos limites da ganância e da luta pelo poder. E faz-nos reflectir, tal como M fez, nas enormes potencialidades de Fritz Lang. Faz-nos recordar que em 1927, quando ainda não existia som no cinema, quando o mundo vivia a ressaca de uma Grande Guerra, um homem conseguiu não só pensar como projectar e criar um mundo futurista, que serviu de base para inúmeros filmes que o sucederam. Um realizador capaz de pensar no Homem como um ser imutável, que sempre será tentado pelo pecado e pela ganância, que faz sofrer sem piedade e que cobra sem perdão. Ver Metropolis não é ver a década de 20. É ver a história do Homem e da Humanidade.


Nota Final:
A



Trailer:





Informação Adicional:
Realização: Fritz Lang
Argumento: Thea von Harbou
Ano: 1927
Duração: 153 minutos

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Óscares 2012 - Um resumo

 

DAFA 2011: Cinema e Televisão


Dentro de dias pretendo começar as minhas premiações de cinema e televisão para o ano de 2011. Tenho filmes que lamento não ter visto, infelizmente (entre eles "Alps", "Shame", "Weekend", "Margaret", "Pariah", entre outros), filmes que ainda pretendo ver ("Hugo" e "Le Havre", por exemplo) e filmes que não quero, pura e simplesmente, ver (como o novo "Transformers" ou o mais recente "Twilight"). Este ano, juntarei aos prémios de cinema os prémios de televisão, nos moldes do que havia feito em 2010 (não sei se terei tempo para uma crítica extensiva de todas as séries que acompanhei no ano transacto; esperemos que sim mas não prometo nada).

Espero que do meu certame de filmes premiados surjam várias sugestões para leitores que não têm podido acompanhar a cobertura (pobre, ainda assim) da corrida aos Óscares deste ano e, acima de tudo, vou tentar ao máximo nomear e falar de filmes mais desconhecidos, alguns destes estrangeiros, que desta forma possam ganham maior audiência. Eles bem merecem. Espero também conseguir cativar a vossa atenção para algumas séries de inegável qualidade que são mais desconhecidas cá pelo território português.

Com isto quero então pedir: há algum filme (ou série) que pensam que eu tenho que ver antes de compilar os meus prémios? Alguma sugestão que me queiram fazer?

Há um ano, os premiados foram estes - AQUI. Se têm interesse em espreitar todos os nomeados, é só clicarem neste link AQUI que vos levará ao separador dos Dial A For Awards de 2010, de onde "The Social Network" saiu vencedor, com cinco vitórias.




 - Os principais vencedores dos DAFA 2010 -

E este ano? Quem acreditam que vai sair vencedor?

MY WEEK WITH MARILYN (2011)




Little girls shouldn't be told how pretty they are. They should grow up knowing how much their mother loves them.


A 15 de Janeiro de 2012, precisamente cinquenta anos depois, o nome de Marilyn Monroe volta a ser mencionado numa cerimónia de entrega de prémios. Michelle Williams vence a categoria de Melhor Actriz - Comédia/Musical pela sua interpretação como Marilyn Monroe em "MY WEEK WITH MARILYN", relembrando - e bem - no seu discurso que vencera o prémio que o astro que interpretou havia vencido também (aliás, o único prémio que a indústria cinematográfica lhe conferiria) em 1960, por "Some Like It Hot". O que é, para mim, mais peculiar é que Michelle Williams tenha vencido o troféu cinquenta anos depois da última aparição ao vivo de Marilyn Monroe, que recebeu o Globo de Ouro para Melhor Estrela Feminina do Cinema, um prémio nos dias de hoje extinto. Monroe viria, de forma infame, a falecer cinco meses depois, em Agosto de 1962. Tinha 36 anos. Não conseguiria imaginar uma forma mais bonita de Monroe ser homenageada do que esta, se bem que acredito que tenha sido acidental.


Voltando ao filme. Foi dito que ninguém conseguiu, consegue ou conseguirá encarnar Marilyn Monroe. É, de facto, uma tarefa hercúlea, efectuar o malabarismo entre a doçura, a sensualidade, a graciosidade, a ingenuidade, o brilho, o talento e a beleza, todas as qualidades que compunham Marilyn Monroe. Ninguém será mais bonito que ela, ninguém alguma vez será mais sensual. Não há no cinema outra como ela - e nunca mais irá haver. Marilyn Monroe surgiu e pereceu como um astro cintilante, um cometa que nos veio iluminar esta Terra por um muito curto espaço de tempo. Com o seu falecimento, o mito permaneceu. Contudo, o que é de valorizar em Marilyn Monroe - e que muito poucos, no seu tempo ou mesmo contemporaneamente, se lembram - é que Monroe era uma representação, um último acto da peça que narrava a vida de uma jovem, Norma Jean, que se entretinha a fingir que era outra pessoa, esta Marilyn Monroe, uma deusa do amor e da sexualidade, que por sua vez decidiu entreter-se a fingir que era uma talentosa actriz, capaz de desaparecer no papel quando a personagem era certa. Assim, retratá-la torna-se impossível. Ou quase. Porque aqui se introduz na equação Michelle Williams, uma das maiores (quiçá a maior) actriz da sua geração, uma mestra na incorporação dos papéis que aceita, um verdadeiro camaleão que habita o íntimo das suas personagens e as faz brilhar. E, tal como a original, a sua Marilyn Monroe brilha. Aliás, ela cega com o seu brilho. Williams pode não ter o andar correcto, pode não ter as formas corporais exactamente iguais, mas a sua Marilyn é indubitavelmente tão ou mais carismática e impressionante quanto a original. A sua interpretação não parece nem um pouco forçada. Claro que ajuda que Williams esteja na verdade a mostrar-nos não como Marilyn era mas a forma como o seu mito é projectado nas nossas mentes nos dias de hoje; ela mostra-nos, essencialmente, como Colin Clark a via (e, por consequência, como a grande maioria de nós a vê, com uma presença tão forte, charmosa e constante que é não dá para nos rendermos a ela). É por isto também que a abordagem de Williams aos momentos de insegurança, de raiva, de angústia de Marilyn Monroe são tão poderosos. Desumanizando a personagem nos momentos mais icónicos, mas cobrindo-a de uma fragilidade e sensibilidade muito palpáveis nos momentos em que ela se encontra mais só, Williams mostra-nos que finalmente chegou a um patamar de excelência só ao nível das maiores actrizes de sempre, como Meryl Streep, Katharine Hepburn, Bette Davis ou Ingrid Bergman.



Para nossa infelicidade, é uma pena que o filme não perdure tão bem na memória quanto a interpretação da sua protagonista. Tal como a própria Marilyn Monroe, "MY WEEK WITH MARILYN" não sabe muito bem o que quer, alternando entre o inconsequente melodrama, a comédia leve e o romance histórico, sem qualquer rumo e fio narrativo, conferindo muito pouco background às personagens para podermos expressar qualquer emoção acerca do que lhes acontece. O filme é baseado no livro de memórias de Colin Clark (Eddie Redmayne, um actor a quem reconheço talento mas que me incomoda solenemente, aqui traído pela parca profundidade que a sua personagem tem), que trabalhou como assistente de produção para "The Prince and the Showgirl", um filme realizado e protagonizado por Sir Lawrence Olivier (Kenneth Branagh, num casting óbvio mas que resulta na perfeição) e para o qual convidou, sem dúvida para trazer mais reconhecimento à produção, Marilyn Monroe (Williams) para ser sua co-protagonista, um filme que assim juntaria a mais famosa estrela de cinema do mundo e aquele que era reconhecido como o maior actor de então.

O filme, famigerado por imensos problemas de produção, ficou também famoso pela dificuldade de entendimento entre Olivier e Monroe, ora porque o primeiro não entendia o propósito do Método - Monroe, quando se apresentava no set, era acompanhada pela sua professora de representação, Paula Strasberg (Zoe Wanamaker), esposa do inventor do Método, que constantemente alterava ordens dadas por Olivier - ora porque Monroe não era, digamos, a maior profissional. Entre inúmeros ataques de raiva, sessões de choro, indisposições e fugas, Monroe enfureceu Olivier a ponto de este querer cancelar a rodagem do filme. Por entre as gravações, vamos sendo dados a conhecer mais e mais sobre quem era esta famosa mulher que tinha o mundo aos pés e vamos percebendo que a vida galante dela não correspondia bem ao que ela esperava. O elenco inclui ainda Julia Ormond no papel de Vivien Leigh (pouquíssimo impressionante, ainda para mais se tivermos em conta o quão fascinante era a original Leigh), Judi Dench como Sybil Thorndike (nada a acrescentar sobre o papel, tão pouco marcante que é) e Emma Watson como uma costureira por quem Colin sente grande afecto.



Apesar das muitas falhas e problemas que a película de Simon Curtis tem, chegamos a um ponto em que falar de "MY WEEK WITH MARILYN" é falar de Kenneth Branagh e Michelle Williams. Se desta última já falámos imenso, há que discutir os méritos do primeiro. Uma interpretação notável de Branagh, que apesar de não ter o estóico aspecto de Olivier compensa pela vitalidade e voluptuosidade que confere à personagem, copiando a voz cortante e ríspida, conseguindo ao mesmo tempo reter a elegância e o ar irresistível do original, personificando sem mácula o desespero e esgotamento de um homem - só por acaso a maior lenda do cinema britânico - testado por uma novata ainda por deixar a sua marca no mundo do cinema e, pior do que isso, imune ao seu charme. Soberbo. Olivier, claro, detestaria esta representação. Duas nomeações aos Óscares bastante merecidas e, na verdade, o prémio merecido para este filme, que pouco mais almejava. Não apresenta nada de novo sobre o ícone, mantendo apenas viva a ideia do mito de Monroe. Há que lhe agradecer por mais uma grandiosa interpretação de Williams. E isso, para mim, já é mais que suficiente.




Nota Final:
C+

Informação Adicional:
Ano: 2011
Realização: Simon Curtis
Argumento: Adrian Hodges
Elenco: Michelle Williams, Kenneth Branagh, Eddie Redmayne, Judi Dench, Emma Watson, Julia Ormond, Toby Jones, Dougray Scott
Banda Sonora: Conrad Pope (e Alexandre Desplat - "Marilyn's Theme")
Fotografia: Ben Smithard

BRITISH TV - ALLO ALLO!



Reservei para este mês uma das mais acarinhadas séries da televisão britânica. Foi com surpresa que descobri que ainda não vos tinha falado sobre ela e a sua ausência é uma falha grande nesta crónica sobre o melhor da televisão britânica. Allo Allo reúne muito daquilo em que os Ingleses são bons: a sátira social, mordaz e negra, associada à humilhação permanente aos franceses e alemães, transformam Allo Allo numa série distinta, não só pela sua qualidade como pela sua ousadia. Poucas séries televisivas foram capazes de trabalhar o polémico tema da II Guerra Mundial de uma forma tão criativa e arrojada, criando uma série de culto, que se estendeu por nove temporadas e que ainda hoje deixa saudades.


Conheçam René Artois (Gorden Kaye), a estrela desta série. Um anti-herói, um homem que não pode, em nenhum momento, ser julgado pela sua aparência flácida e desleixada. Ele é o dono de um pequeno café/restaurante na Paris da década de 40, em plena Grande Guerra. O seu café, frequentado essencialmente por alemães, é um tesouro de surpresas. René é casado, mas o seu apetite pelo sexo feminino não se consegue (nunca!) resumir a uma única mulher. René é galã. No seu café, todas as mulheres são suas e todas as mulheres se perdem de amores pelo seu charme. Inteligente, não só para enganar a sua mulher como cada uma das empregadas, René trabalha em segredo com os Franceses e os Ingleses e, aos poucos, transforma o seu café num dos mais importantes focos de espionagem dos Aliados.


O que nos entretém em Allo Allo! é a versatilidade da personagem de René. Imparável, indomável, inigualável. Esta é uma série que merece ser vista lentamente, aos longo de vários meses. Não aconselho o leitor a vê-la de uma só vez. A qualidade de Allo Allo merece ser saboreada, descoberta gradualmente. Porque esta é uma das mais belas obras-primas que os Ingleses alguma vez fizeram. E acaba de se juntar ao nosso clube do British TV.

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Vale a pena ver, quem ainda não viu


Vencedor de dois BAFTA a semana passada (Melhor Documentário e Melhor Edição), "SENNA", o filme de Asif Kapadia sobre o extraordinário piloto de Formula 1 Ayrton Senna, já analisado cá no DPFP (aqui), que tem corrido todo o mundo para grande aclamação crítica, chega agora à televisão portuguesa, para que o possa apreciar no belo conforto do seu lar.


29 de Fevereiro, 22.30, TV Cine 4. Eu vou voltar a ver. E vocês?
 

Crítica Dupla: MONEYBALL (2011)

Bem-vindos ao Crítica Dupla, um segmento que fazemos algo irregularmente aqui no Dial P For Popcorn, em que eu e o João nos debruçamos sobre um filme sobre o qual estamos bastante divididos, sobre um filme e a sua sequela, sobre um filme e o seu remake... Bem, penso que já perceberam. O objectivo é proporcionar uma discussão saudável, sem controvérsia, dos méritos do filme (ou dos filmes) de acordo com cada um de nós. Esta semana, o filme em foco é "MONEYBALL", de Bennett Miller, que originou opiniões bastante díspares cá no DPFP.





MONEYBALL, por Jorge Rodrigues:


"MONEYBALL" poderia tentar ser mais um filme sobre o triunfo no desporto, cheio de grandes cenas inspiradoras e elevadoras do espírito humano, que culminaria com uma enorme vitória ou abundante prosperidade ou uma lição de vida aprendida. Os grandes filmes que envolvem desporto (desde "The Fighter" a "Rocky", de "Field of Dreams" a "Remember the Titans") são todos assim. Felizmente, "MONEYBALL" optou simplesmente por ser uma poética homenagem a Billy Beane e aos Oakland Athletics, que independentemente de terem vencido ou perdido, contrariam o ditado que para a história só ficam os vencedores, deixando uma marca indelével, revolucionária, no jogo que tanto amam. Além disso, "MONEYBALL" procura contar ainda uma história mais particular, a da forma como Billy Beane consegue reinventar o jogo que ele era suposto ter dominado, vinte anos antes, e provar a todos que um jogador é mais que um número, é mais que estatística.


Com um diálogo absolutamente vívido e electrizante, igual partes profundo e inteligente - ou não fosse este mais um produto das mãos de Aaron Sorkin, contratado para polir o argumento escrito pelo também Oscarizado Steven Zaillian - que coloca - e bem - o foco não no desporto em si mas nas pessoas que o fazem, com caracterizações muito autênticas que ganham colorida vida nas mãos do talentoso elenco que Bennett Miller tem à disposição, desde um cintilante Philip Seymour Hoffman, uma elegante Robin Wright, uma encantadora Kerris Dorsey, um divertido Jonah Hill e, sobretudo, um extraordinário Brad Pitt, o verdadeiro coração do filme. A auxiliar o poderoso argumento está uma fotografia exemplar de Wally Pfister e uma edição brilhante de Christopher Tellefsen, que condensa o filme de forma exímia, conferindo-lhe um ritmo excitante de seguir. Há que elogiar ainda o trabalho de Bennett Miller ("Capote"), que contribui imenso para o sucesso do filme embora quase não se note, sendo que é nos pequenos detalhes que se nota o seu trabalho. É um trabalho ingrato enquanto realizador, ter que mostrar e não deslumbrar. Mas era o que o filme aqui precisava. E ele cumpriu na perfeição.

Finalmente, toda a gente sabe que Brad Pitt é um dos melhores actores americanos das últimas décadas, arrancando excelentes interpretações de quase todos os seus papéis. Infelizmente, a sua beleza, carisma e a sua fama acabam por ofuscar um pouco o seu talento. Em "MONEYBALL", não há essa preocupação. Despido de quaisquer preconceitos em ser visto como um zé-ninguém (algo que Pitt já não se deve lembrar de ser, dado o seu estatuto de mega-celebridade) derrotado pela vida, o seu Billy Beane sabe, melhor do que ninguém, o risco que corre ao apostar em Peter Brand (Hill), que nunca sequer praticou basebol na vida, para ajudá-lo a dar a volta à injustiça que é o jogo, contratando jogadores que nenhuma equipa queria e, através de um sofisticado sistema estatístico, ganhar pontos através de habilidades particulares que cada jogador tem. Estas decisões controversas e polémicas garantem-lhes a fúria de todos, incluindo a sua equipa de observadores, os comentadores de televisão e da rádio e o treinador, Art Howe (Hoffman), um homem da velha guarda. Pitt desaparece no papel - em 2011 fê-lo novamente noutro papel, em "The Tree of Life" - conferindo a Billy Beane uma graciosidade, um genuíno e humano sentido de estar na vida que é incomum nas suas outras interpretações. Este Billy Beane é uma criação completa, cheia de alma, força e coração (reunindo todas as qualidades de Brad Pitt enquanto actor num só indivíduo).


Um filme tão irreverente como o seu protagonista, "MONEYBALL" não busca respostas, nem procura fazer o espectador sentir-se melhor pessoa por ter visto o filme. Não é um filme com um final feliz. É um filme com um final real. Billy Beane seguiu o seu instinto - aquela palavra que tanto o perturbava inicialmente - como se soubesse que esta revolucionária mudança que estava a tentar implementar fosse realmente a sua última oportunidade de glória. O seu sucesso não foi total - não conseguiu mudar a face do jogo para sempre. Ainda assim, provou que com pouco se pode fazer muito, transformando a sua equipa, das mais pobres da Liga, numa força a ter em conta pelas equipas ricas, basicamente ignorando tudo aquilo que até então lhe tinham ensinado sobre o jogo e as suas regras. Um filme a espaços emocionante, a espaços reflexivo, meditativo, "MONEYBALL" foi uma das boas surpresas do ano, rico, substancial e profundo, a história de um homem imperfeito que só agora descobre finalmente o seu rumo. Mais vale tarde que nunca.



Nota Final:
A-

MONEYBALL, por João Samuel Neves:



Previsível e entediante. Assim é "MONEYBALL". Provavelmente fazendo justiça ao desporto que representa (o basebol) onde só quem gosta percebe o sentido do jogo e saboreia cada um dos seus demorados momentos (desde os preparativos às jogadas propriamente ditas). Podia pontuá-lo com uma nota pior, sem dúvida, mas há pontos positivos que vale a pena ressalvar e que merecem ser tidos em conta. Desde logo, o ambiente do filme. Foi aquilo de que mais gostei e o que me permitiu aguentar o filme até ao seu final. Sente-se a excitação e a intensidade de quem é amante deste desporto. Percebe-se porque é que o desporto é pensado e encarado com enorme responsabilidade e profissionalismo, dá-nos um cheirinho do trabalho hercúleo de gestão e organização de um equipa de alto nível. Coloca-nos dentro da acção e junto dos seus protagonistas.


Desse ponto de vista, "MONEYBALL" é um bom filme. Tem também boas interpretações, com Brad Pitt e (especialmente) Jonah Hill que apimentam a história e lhe dão mais alegria, vida e realismo. Mas depois tem alguns aspectos menos positivos. É tremendamente previsível. É possível perceber-se, desde os primeiros 10 minutos, aquilo que será o filme. E isso, para mim, é algo muito negativo, em especial num filme sobre desporto, em que a emoção e a imprevisiblidade nos alimentam até ao clímax final. A própria história em si (um manager de uma equipa com dificuldades que consegue, graças a um inovador esquema informático, revolucionar a forma como se encara e pensa o jogo) é algo que cativa pouco quem não gostar realmente deste jogo. No final, "MONEYBALL" é um filme jeitoso de 2011. Mas não vai entrar no meu top-10. Nem sequer no meu top-20. 


Nota Final:
C
  


Informação Adicional:

Ano: 2011
Realizador: Bennett Miller
Argumento: Steven Zaillian, Aaron Sorkin
Elenco: Brad Pitt, Jonah Hill, Chris Pratt, Robin Wright, Philip Seymour Hoffman
Banda Sonora: Mychael Danna
Fotografia: Wally Pfister

 

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

THE IRON LADY (2011)


"It used to be about trying to do something. Now it's about trying to be someone."

Duvido que em 2011 exista alguma interpretação deste nível. Meryl Streep é, sem dúvidas, para muitos dos amantes do cinema, uma das mais carismáticas e completas actrizes da história do cinema. É difícil sair-se mal e é frequente vê-la a ser brilhante. Num mundo justo, esta seria a interpretação vencedora da estatueta dourada para Melhor Actriz. É arrebatador o seu trabalho.



Quanto ao filme, a história é outra. Saiu mal. A intenção foi a melhor (percebe-se isso, pela forma cuidada como se envolve a atmosfera à volta da personagem de Meryl Streep) mas não era assim que o filme deveria ter sido reproduzido. Está tudo errado infelizmente. Pegou-se numa Margaret Thatcher decadente, decrepita, senil e completamente acabada e, a espaços, foi-se reconstruíndo o seu passado, sem lógica e praticamente sem qualquer critério. Para os mais desatentos, The Iron Lady, um filme que tinha tudo para nos contar uma história apaixonante, inspiradora e emotiva, transforma-se num filme cansativo, pachorrento e maçador. Não existe o enorme sentimento de glória, confiança e carisma que se viu na mulher que liderou uma nação. Não é transmitida a sua verdadeira história, não é transmitido o carisma e a força desta mulher de ferro.



Foi pena terem entregue este projecto a Phyllida Lloyd. Margaret Thatcher, a Grã-Bertanha, a interpretação de Meryl Streep mereciam algo melhor. Algo muito melhor. Mereciam, pelo menos, um filme que acompanhasse a qualidade da interpretação da maior diva viva do cinema. Em The Iron Lady, há muita Meryl Streep para tão pouco cinema.


Nota Final:
D+



Trailer:





Informação Adicional:
Realização: Phyllida Lloyd
Argumento: Abi Morgan
Ano: 2011
Duração: 105 minutos.


quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

THE ARTIST (2011)



"Look at what you've become."


Nostalgia. Um sentimento tão familiar e genuíno, igual parte agradável e desconcertante, inerente à realidade humana. Um sentimento que parece ter estado bastante patente ao longo do cinema de 2011, de "Hugo" a "Midnight in Paris", e que parece encontrar o seu expoente máximo em "THE ARTIST". É uma pena que se tenha tentado fazer de "The Artist" a obra-prima que ele não é, que se tenham criado expectativas ridiculamente altas em torno do filme para, no fim, estas saírem defraudadas e se passar a odiar, de forma também exagerada, um filme que mais não quer do que mostrar o quanto está apaixonado e nos quer apaixonar por outra era, por outro tipo de cinema. É um filme enamorado consigo próprio e, nos seus melhores momentos, enamorado com o próprio cinema a que faz homenagem. Infortunadamente, é também um filme incrivelmente previsível e abundante em redundância que o torna, de facto, um mau espécime para servir de porta-estandarte ao ano da celebração do cinema clássico por excelência.  


Filmado integralmente a preto e branco e quase inteiramente mudo, "The Artist" abre inteligentemente com a instrução "Please be silent behind the screen", nos bastidores do cinema onde está a decorrer a exibição inaugural da nova película de George Valentin (Jean Dujardin), "A Russian Affair". Minutos de tensão e suspense seguem o final da projecção, seguidos de alívio e congratulações ao escutar tão estrondoso aplauso. Este tipo de piada subliminar repetir-se-á ao longo de todo o filme, com maior sucesso numas ocasiões que noutras, mas nunca correndo o risco de exagerar.


A história de "The Artist" segue a linha de "A Star is Born" e, em menor grau, de "Sunset Boulevard", com o grande actor da era silenciosa a cair em desgraça com o advento dos filmes falados, ao mesmo tempo que a naïve estreante que outrora ele ajudou no princípio de carreira ascende na hierarquia da fama. Num primeiro encontro epicamente romântico, Peppy Miller (Bérénice Bejo), uma apaixonada pelo cinema, vê o seu sonho tornar-se realidade ao transformar-se numa sensação da noite para o dia depois de surgir abraçada ao seu ídolo George Valentin numa foto de jornal. Atraente, divertida e cheia de potencial, daí ao estrelato foi um passo e, de um dia para o outro, a sua carreira sobe estratosfericamente, enquanto a de Valentin, que se recusa a acreditar que a forma de arte que lhe era tão querida esteja a desaparecer, declina. A melhor comparação que vi fazer a este filme, na verdade, foi com outro nostálgico filme sobre um homem que se vê subitamente ultrapassado e que passivamente aceita que a sua arte, outrora tão apreciada, seja hoje descartada por uma indústria - e um mundo - em constante evolução: o belíssimo "L'Illusioniste", de Sylvain Chomet. Ambos se servem de um personagem que diz com uma expressão tanto ou mais do que o que diria se pudesse falar. Ambos os filmes acabam por dolorosamente aceitar o destino do seu protagonista. 


Que em "The Artist" este semblante de auto-comiseração resulte tão bem se deve a Jean Dujardin numa cintilante interpretação. Dujardin fornece a Valentin uma dose bem reforçada de magnetismo, magia e carisma mas também de vulnerabilidade e sensibilidade que o tornam impossível de resistir. Bejo, muito criticada pela fraca dimensão da sua personagem e pelo pouco esforço requerido, foi para mim uma revelação: a meu ver, o filme não funcionaria tão bem se Peppy não fosse o vulcão de positivismo e simpatia que é. E é preciso uma actriz incrivelmente convincente nesse papel para em poucos minutos criar empatia suficiente para querermos que esta seja bem sucedida e não a amaldiçoarmos pelo destino de Valentin.


Um cinéfilo inveterado e um mestre da pastiche, Hazanavicius sente-se em casa neste tipo de filmes, como o mostra a sua fascinante direcção, carregada de criatividade, inspiração e audácia. Hazanavicius nunca deixa o seu filme-dentro-de-um-filme alcançar a promessa das cenas iniciais, com o seu incapaz argumento a deixá-lo ficar mal na segunda metade do filme, em que a inovadora e calorosa auto-reflexão crítica a que se propõe é trocada por uns bem conseguidos momentos de sentimentalismo que o filme, entretanto, fez por merecer.


Emotivo e enternecedor, infecciosamente alegre, "The Artist" merece ser celebrado, mais não seja porque, talvez sem o próprio filme se aperceber disso, procura replicar no espectador de hoje, de forma incrivelmente astuta, a reacção que o espectador dos anos 20 deverá ter tido quando, ao fim de tanto tempo sem som, os filmes decidiram finalmente ganhar voz. Um pormenor que hoje em dia pode parecer insignificante, mas que depois de mais de hora e meia privado de som, faz toda a diferença. Se "The Artist" fosse somente um exercício estético redundante de imitação, de simulacro cinematográfico, carregado de clichés e inconsequência, seria ainda assim um maravilhosamente belo e bem executado. Como é, ao som da esplêndida banda sonora de Ludovic Bource, que literalmente tece o pano de fundo do filme (e sem a qual este não subsistia), "The Artist" é uma visão luminosa, entusiasmante e positiva sobre a evolução no cinema, na arte, na vida. Mais deslumbrado que deslumbrante (como bem relembra o Flávio Gonçalves na sua crítica ao filme), concordo, até porque o considero irremediavelmente demasiado elogiado; um enorme e sincero prazer, de qualquer forma.


Nota Final:
B+

Informação Adicional:
Ano: 2011
Realizador: Michel Hazanavicius
Argumento: Michel Hazanavicius
Elenco: Jean Dujardin, Bérénice Bejo, Missi Pyle, James Cromwell, John Goodman, Penelope Ann Miller
Banda Sonora: Ludovic Bource
Fotografia: Guillaume Schiffman
Duração: 100 minutos

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

THE MUPPETS (2011)





Vai ser complicado falar deste filme sem me empolgar. Foi sem dúvida um dos momentos mais agradáveis que já tive numa sala de cinema. Os Marretas é um filme espectacular! Resume-se numa palavra. Espectacular. Do início, ao final (incluindo os créditos!).



Começamos pelo princípio. Walter é um boneco. Gary (Jason Segel) um jovem. Crescem e vivem como dois irmãos. São os melhores amigos, inseparáveis e companheiros para todos os momentos e aventuras. Partilham, entre outros, uma enorme admiração pela série infantil Os Marretas, um hábito e um interesse que cultivaram durante todo o seu crescimento. Quando Gary decide fazer uma viagem romântica com a sua noiva Mary (Amy Adams), não resiste em convidar o seu eterno amigo. Juntos visitam os antigos estúdios onde a sua série favorita foi gravada e rapidamente Walter percebe que algo de errado se passa com o local que produziu toda a magia que durante tantos anos o maravilhou.


O plano maquiavélico do magnata Tex Richman, que pretende transformar os velhos estúdios numa lucrativa exploração de petróleo é o ponto de partida para uma aventura incrível. Walter decide visitar o Sapo Cocas e convence-o a reunir toda a equipa dos Marretas e juntos trabalham na organização de um mega espectáculo que lhes permita reunir o dinheiro suficiente para recuperarem os velhos estúdios e garantirem que os sonhos e as ilusões dos seus fans para sempre terão um local de culto, onde a realidade se misturará com a ficção.


Inteligentíssimo, feito para enternecer miúdos e graúdos, com uma base muito sólida e construído com muita inteligência (é perfeitamente compreensível para qualquer pessoa que nunca tenha visto qualquer episódio das séries originais, graças ao enorme trabalho de selecção de cenas-chave, que definem e caracterizam cada um dos bonecos da série), Os Marretas é um filme para o qual todos os adjectivos serão brandos. Divertido, hilariante e completamente imprevisível. É rir do princípio ao fim, literalmente. Que fantástico argumento aqui está. E uma banda-sonora tão cativante e viciante, que ainda hoje a ouço com imenso prazer.


Uma óptima escolha para ver em família, com a namorada ou com os amigos. Os Marretas é um dos meus filmes favoritos deste ano.



Nota Final:
A
-



Trailer:





Informação Adicional:
Realização: James Bobin
Argumento: Jason Segel e Nicholas Stoller
Ano: 2011
Duração: 103 minutos