Por ocasião da estreia nacional do novo filme de Matt Reeves (Cloverfield), "Let Me In", decidimos embarcar em mais uma edição da nossa rubrica, Crítica Dupla. Anteriormente fizemo-lo com os dois "Wall Street" e com "The Departed / Infernal Affairs" e, como correu bem, decidimos voltar a experimentar.
LET THE RIGHT ONE IN (2008)
por Jorge Rodrigues:
"Let the Right One In" e eu temos uma história engraçada. É que foi dos poucos filmes estrangeiros que vi de livre e espontânea vontade. Bem, explicando melhor: são raras as vezes que me incito a ver filmes estrangeiros sem estes terem uma forte razão a recomendá-los (seja aclamação crítica, excelentes reviews, potencial para Óscares e outros prémios, actores conhecidos ou realizadores prestigiados por trás, entre outras). É por isso que ainda mais me surpreende que eu, conhecendo o tema do filme e conhecendo esta minha tendência, tenha ido ver o filme. Um filme que então era um pequeno filme suueco, que tinha feito furor em Gotemburgo e estas ondas de entusiasmo se estavam a espalhar para outros países europeus. Um filme que ainda não sonhava com o estatuto de clássico moderno com que agora é rotulado, muito antes de ter alcançado o outro lado do globo, muito antes de lhe choverem elogios em cima.
Antes de mais, quero relembrar que este filme foi lançado no ano em que a mania dos vampiros invadiu o mundo - portanto, no mesmo ano em que a magnífica "True Blood" faz a sua estreia em televisão e em que o fenómeno "Twilight" chega finalmente aos cinemas. Pelo meio disto tudo, surge este "Let the Right One In". Era natural que fosse olvidado. Felizmente mais e mais pessoas estão a aperceber-se do quão fantástico este filme é.
A história introduz-nos a personagem de Oskar, um rapaz louro, de aspecto pálido, com doze anos de idade, que vive com a sua mãe divorciada (aliás, os seus pais são das pessoas mais horríveis que já alguma vez vi retratadas em filme) num apartamento nos subúrbios de Estocolmo. Oskar é um rapaz solitário e infeliz que sofre de bullying na escola. Este vê a sua vida mudar repentinamente com a chegada de Eli, uma rapariga de aspecto misterioso, que parece diferente de todas as outras, com quem Oskar vai travar uma forte amizade. A sua cena de apresentação é tão sublime quanto assustadora. Eli surge acompanhada de uma figura paternal que vemos auxiliá-la em obter tudo quanto necessita para ela sobreviver.
O filme depois assume os contornos de filme de terror, mostrando-nos Eli a atacar várias pessoas da região. O que é atípico nestas cenas é a qualidade e o cuidado demonstrados pelo realizador em dar um ar de sofisticação. As cenas de violência são vivas, duras, pesadas, é verdade, mas em todas existem momentos de graciosidade e de beleza. Manchas de sangue cuidadosamente empregues, imagens das planícies suecas invadidas por neve, árvores com ramos cobertos de neve, flocos de neve a pairar no ar... Belíssimo.
Esta amizade bizarra torna-se o coração e a acção motriz do filme, acompanhando o pequeno Oskar até este ser levado ao limite por Eli, impossível de ser parada. Ao longo do filme este vai-se apercebendo cada vez mais do quão difícil é escolher entre a amizade e o afecto que nutre por Eli e a impossibilidade de actuação perante a sua cognisciência do que ela faz aos outros indivíduos. A sua passividade, a sua permissividade, a sua falta de emoção, de reacção, faz-nos também a nós sentir tudo à flor da pele, enquanto assistimos impávidos ao que se passa no ecrã.
Um brilhante argumento de John Lindqvist, adaptando o seu próprio bestseller, uma realização fabulosamente bem orquestrada de Thomas Alfredson e estupendas interpretações dos miúdos Hedebrant e Leandersson e uma fotografia assombrosa de van Hoytema, que confere ao filme todo um ar soturno, sombrio, frio, algo elégico até, que o filme necessita para estabelecer o tom que quer conferir ao enredo e nos dar a perceber que este não é o típico filme de vampiros.
Finalmente, é altura de fazer um desabafo: com um filme tão bom quanto este, que apenas tem dois anos de existência, qual é o motivo que Hollywood me apresenta (aparte de fazer mais dinheiro) para justificar o investimento neste remake, sabendo de antemão que a grande maioria dos remakes não chega aos pés da qualidade do seu antecessor (ver: "Brodre"/"Brothers") ou, miraculosamente, consegue com esforço igualar a qualidade do original (ver: "The Departed"/"Infernal Affairs")? Não entendo. Há-de ser sempre uma mania que eu não consigo perceber.
Nota Final:
B+
Trailer:
Informação Adicional:
Realização: Thomas Alfredson
Argumento: John Lindqvist
Elenco: Kare Hedebrant, Lina Leandersson, Per Ragnar, Henrik Dahl, Ika Nord
"Let Me In", a versão americana do sucesso sueco "Låt den rätte komma in" (que infelizmente ainda não vi por um conjunto de circunstâncias) foi um filme que me agradou. Não ficará para a história nem será lembrado dentro de alguns meses, mas valeu o bilhete do cinema.
Peca, como era já natural e esperado, pelo facto de não ser uma ideia original e de me ter deixado no ar a ideia de que "isto nas mãos dos suecos deve estar um mimo". Alimentou-me, muito, a curiosidade para ver o filme sueco.
No entanto, falemos de Let Me In. É uma boa adaptação do cinema americano e merece o meu reconhecimento. Os americanos têm uma tendência natural para transformar o "nu e cru" em "kiss and hugs" e em Let Me In essa tradição conseguiu, parcialmente, ser posta de parte. Repito, não vi o filme original e toda a crítica é feita apartir daquela que me parece ser a ideia do argumento original e daquelas que são as potencialidades do cinema sueco.
Tal como no original, tudo começa com a chegada de uma misteriosa rapariga Abby (Chlöe Moretz) ao condomínio de Owen (Kodi Smit-McPhee). Owen, um rapaz solitário e tímido, passa grande parte dos seus dias no pátio do seu condomínio, onde alguns dias após a chegada de Abby, esta acaba por meter conversa com ele. Juntos começam a construir uma amizade bonita, que para Owen era até então algo completamente inimaginável com alguém. Os conselhos de Abby sobre como Owen se deve defender na escola dos rapazes que constantemente o agridem dão resultado e Owen apaixona-se por Abby. No entanto, o modo como Abby vive e todo o mistério à volta dos seus hábitos (e dos do seu "pai") começam a tornar-se demasiado estranhos para Owen que se decide a descobrir o que se passa por detrás das frases misteriosas que Abby lhe vai deixando.
Com belas prestações tanto de Kodi Smit-McPhee (foi uma grande escolha para o papel de rapaz oprimido e ostracizado que desempanha) como de Chlöe Moretz (uma rapariga que promete muito!), Let Me In é uma tentativa que passa com nota positiva. De referir que os cartazes feitos para a publicidade do filme são bastante pobres e acabam até por lhe retirar algum público. Têm pouco a ver com a ideia do filme e não são nada cativantes.
Num comentário final, e sem menosprezar a qualidade que o filme tem, penso que viveríamos bem sem esta adaptação que, perante a qualidade do filme original, se torna um pouco desnecessária. Era, à partida, uma adaptação condenada a ser pior do que o original. E, na minha opinião, para se fazer pior, mais valia a pena terem estado quietos.
Nota Final:
B
Trailer:
Informação Adicional:
Realização: Matt Reeves
Argumento: Adaptação de Matt Reeves do argumento original de Lindqvist
Elenco: Richard Jenkins, Kodi Smith-McPhee, Chlöe Moretz
Fotografia: Greig Fraser
Banda Sonora: Michael Giacchino
Ano: 2010
Duração: 116 minutos
4 comentários:
O LET THE RIGHT ONE IN é claramente melhor por uma razão muito óbvia: é original. Além de a nível de ambiência apresentar uma atmosfera bem mais fria (o LET ME IN estranhamente introduz uns momentos quentes na história, em termos de luz), o facto de ter sido o primeiro filme a abordar a mesma história ajuda. Mas na verdade LET ME IN só perde por ser uma cópia do original, porque se o analisarmos sem conhecimento da existência do filme sueco, é um dos melhores filmes que estreou este ano e um excelente produto americano. Bónus da versão americana: um acidente de carro estrondosamente bem filmado!
Pois, essa é logo a grande nota de destaque e é aquilo que me irrita tanto no LET ME IN.
Temos um original de qualidade elevadíssima, onde pouquíssimos pontos fracos há, com dois anos apenas de existência.
Qual é a necessidade de fazer um novo? Legendas? Dinheiro? Isso são lá razões para uma indústria que devia pôr a arte à frente do dinheiro? É que não me podem dizer que estavam à espera que o LET ME IN fizesse um box office tipo o do Eclipse. Não podem.
E entretanto vamo-nos queixando e já Carancho está preparado para (também ele) ser adaptado em Hollywood. Não há pachorra.
Cumprimentos e obrigado pelo comentário,
Jorge Rodrigues
Também já vi os dois.
Sublinho o que escreves sobre o sueco, e sublinho o que diz o Tiago. A atmosfera. Que brilhante. O argumento é outra coisa muito boa, mas essa passa quase integralmente para o americano (embora acabem por cometer, a meu ver, um grosseiro erro de estrutura, ao começar in medias res com o tutor e voltar a trás, voltando a passar por lá, o que lhe confere uma importância que ele não tem).
Não acho que a nota seja assim tão positiva. Tem pontos bastante positivos (o acidente é incrivelmente bem feito, bem filmado, que pedaço de cinema !), que revelam o talento do realizador Matt Reeves.
eu não entendo!
eu já vi o primeiro filme, e lembro que a Eli diz que não é uma garota!
Na metade do filme oskar olha pela porta onde Eli estava trocando de roupa, e ele vê ela nua! e ela tem uma cicatriz na vagina! Então eu penso:Ela diz que não e uma garota!,e tem uma cicatriz na vagina! ELA E HOMEM? ou no caso ELA ERA HOMEM? Me expliquem isso! >.<
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