Para ajudar a limpar o paladar de tanto artigo sobre animação, decidi oferecer a minha opinião sobre a lista dos filmes a competição nos dois festivais que mais aprecio, a Biennale de Veneza e o Festival de Toronto (TIFF).
Como eu gosto da época de festivais. O primeiro local de passagem dos grandes candidatos aos Óscares, salvo algumas (raras - e cada vez mais o são) excepções. Local de destruição de sonhos, de construção de campanhas, de origem de algumas das mais bem sucedidas Oscar stories dos últimos anos. Veneza foi onde Colin Firth, em 2009, começou, de forma algo surpreendente, a sua corrida a Melhor Actor por "A Single Man". Em 2010 foi em Toronto e Telluride que o mesmo viria a repetir esta mesma campanha, desta feita sorrindo a ele a sorte no final. Foi em Veneza o ano passado também que Natalie Portman iniciou a sua trajectória de sucesso. A Biennale premiou apenas Mila Kunis mas "Black Swan" viria a conquistar o mundo, conquistando oito nomeações. Toronto é habitualmente lugar onde os filmes independentes dão à costa. "Juno" e "Little Miss Sunshine" foram destaques em 2007 e 2006, respectivamente, levando as audiências ao rubro - e obviamente a Academia também. Já Veneza é mais local de prestígio para desfile de estrelas e de grandes realizadores. E este ano, uma vez mais, não é excepção - cada um apresenta um pouco do mesmo de outros anos, numa tentativa de agradar tanto a quem os visita pela mostra cinematográfica, como quem se desloca aí para ver as estrelas e como quem só quer passar um bom bocado dentro de uma sala de cinema. Vejamos a programação de cada.
VENEZA
O Festival de Veneza é o primeiro a abrir, a 31 de Agosto, estendendo-se até 10 de Setembro, três dias após a abertura do Festival de Toronto. Pelo meio ainda há Telluride. Veneza abre com um filme carregado de estrelas: o thriller político "The Ides of March", realizado por George Clooney, que deverá garantir sala esgotada e público ao rubro para aplaudir Clooney, Gosling, Seymour Hoffman, Tomei, Giammati e Wood. A constelação de estrelas deve continuar com a estreia de "Contagion", que trará Steven Soderbergh, Matt Damon, Kate Winslet, Marion Cotillard e Gwyneth Paltrow a Itália. Os outros três grandes títulos do ano que Veneza vai estrear são, indubitavelmente, três grandes pontos de interrogação. "Carnage", de Roman Polanski, conta com Kate Winslet, Jodie Foster, John C. Reilly e Christoph Waltz no elenco, o que, em teoria, seria garantia de sucesso. A ver vamos. "A Dangerous Method" é o primeiro filme prestige de David Cronenberg e conta com Michael Fassbender, Keira Knightley e Viggo Mortensen nos principais papéis. Contudo, Cronenberg já avisou que não é para todos os gostos e que é um trabalho bem experimental. O que só me excita mais, embora acredito que para a Academia a reacção seja oposta. Finalmente, teremos ainda um ar de sua graça com "Tinker, Taylor, Soldier, Spy" de Thomas Alfredson ("Let the Right One In"), que poderá trazer a Gary Oldman o seu primeiro Óscar - e, dizem as primeiras críticas, a Colin Firth o seu segundo.
Outros filmes que me suscitam grande interesse são o novo projecto de Yorgos Lanthimos ("Dogtooth"), intitulado "Alps"; a nova incursão de Madonna pela sétima arte, na forma de "W. E."; o novo trabalho de Satrapi e Paronnaud, "Chicken with Plums", responsáveis pela maravilhosa "Persepolis"; o novo filme do grande Steve McQueen, "Shame", que o reúne com Michael Fassbender depois de "Hunger"; e a surpreendente Andrea Arnold que, depois de "Fish Tank", se propôs a adaptar "Wuthering Heights" para os tempos modernos.
O resto das estreias mundiais de Veneza são um misto de grandes autores - Alexander Sukurov ("Faust"), Abel Ferrara ("Last Day on Earth"), William Fredkin ("Killer Joe"), Todd Solondz ("Dark Horse"), Mary Harron ("The Moth Diaries") e Jonathan Demme ("I'm Caroline Parker: The Good, the Mad and the Beautiful") - ilustres quase-desconhecidos como Chantel Akerman ("La Folie Almayer"), Philippe Garrel ("A Burning Hot Summer"), Eran Korilin ("The Exchange"), Ami Canaan Mann ("Texas Killing Fields"), Wei Te-Sheng ("Seediq Bale"), Sion Sono ("Himizu") e realizadores italianos como Cristina Comencini ("Quando La Notte"), Gipi ("L'ultimo Terrestre") e Emanuele Crialese ("Terraferma"). E James Franco ainda arranja tempo no meio de tanto projecto para realizar "Sal".
De notar ainda a presença de duas películas portuguesas nas secções fora de competição: a longa-metragem "Cisne" de Teresa Villaverde e a meia-metragem "Palácios da Pena", de Gabriel Abrantes e Daniel Schmidt, ambos na secção Horizontes.
O festival é encerrado por "A Damsell in Distress" de Stillman. Podem consultar o programa na íntegra AQUI.
TORONTO
O Festival de Toronto, por sua vez, abre a 8 de Setembro. Muito mais habituado que o seu congénere italiano a ser um autêntico íman para estreias mundiais e norte-americanas dos grandes candidatos aos Óscares (a par com o seu companheiro do Colorado, o Telluride Film Festival, que começa dias antes), o Festival de Toronto gera, de facto, muito maior apetência só pelo potencial (em bruto) da sua programação. Este ano é ainda melhor do que o ano passado em termos de estreias e fará, sem dúvida, as delícias de quem se deslocar a território canadiano.
Toronto decidiu abrir as hostes em modo low profile, com "From the Sky Down", um documentário de David Guggenheim sobre os U2, embora tenha em "Moneyball" de Bennett Miller, que conta com Brad Pitt, Jonah Hill e Philip Seymour Hoffman o seu título de maior peso. Contudo, o grande aperitivo do festival, pelo menos a meu ver, é o novo filme de Alexander Payne, "The Descendants", protagonizado por George Clooney. A última vez que Payne realizou um filme - e o estreou em Toronto e Telluride - foi "Sideways" e toda a gente sabe como isso acabou, por isso a expectativa sobre este "The Descendants" é enorme.
Toronto vai ser também o palco da primeira ronda da batalha hercúlea entre Meryl Streep e Glenn Close pelo troféu de Melhor Actriz, com a estreia mundial de "Albert Nobbs". Visto que "The Iron Lady" não deverá surgir em nenhum festival até ao seu dia de estreia norte-americana nos cinemas, Glenn Close poderá aqui ganhar uma preciosa vantagem junto da crítica e gerar buzz importante que a impulsione para a frente da corrida. Entre as restantes estreias mundiais temos os novos projectos de dois enormes realizadores ("Twixt" de Francis Ford Coppola e "The Lady" de Luc Besson), "Take This Waltz" de Sarah Polley, "The Eye of the Storm" de Fred Schepisi e "The Deep Blue Sea" de Terrence Davies à procura de compradores, bem como o novo filme de Fernando Meirelles, "360", que busca redenção após o falhanço de "Blindness". Entre os filmes com enorme buzz que esperam tirar partido de Toronto encontramos "50/50" de Jonathan Levine com Joseph Gordon-Levitt, Seth Rogen, Anna Kendrick e Anjelica Huston, "A Better Life" de Cédric Khan, "Jeff Who Lives at Home" dos irmãos Duplass, "Machine Gun Preacher" de Marc Forster, "Rampart" de Oren Moverman, o brilhante realizador por detrás de "The Messenger", "Salmon Fishing in the Yemen" do amigo da Academia Lasse Hallstrom ("Chocolat", "Cider House Rules"), "Ten Year" de Jamie Linden, "Friends with Kids" de Jessica Westfeldt, "Tyrannosaur" de Paddy Considine, "Burning Man" de Jonathan Teplitzky e o novo filme de Michael Winterbottom ("A Mighty Heart"), "Trishna". Surpreendentemente, a adaptação de Shakespeare por parte de Roland Emmerich, "Anonymous", também arranjou colocação na programação de Toronto.
Como de costume, Toronto também reúne a grande maioria das estreias mundiais de Cannes e Veneza para a sua estreia norte-americana, bem como alguns títulos presentes em Sundance e em Berlim nos festivais do primeiro trimestre de 2011. Assim, "A Dangerous Method", "Chicken with Plums", "Dark Horse", "The Ides of March", "Shame", "W. E." e "Killer Joe" farão a sua estreia em território norte-americano após surgirem no Festival de Veneza.
"Drive" de Winding Refn, "Habemus Papam" (o novo filme de Nanni Moretti que surpreendentemente não surge na programação do festival italiano), "The Artist" de Hazanavicius, "The Woman in the Fifth" de Pawlikowski, "Melancholia" de Lars von Trier, "La Piel Que Habito" de Pedro Almodovar e "We Need to Talk About Kevin" de Lynne Ramsay também reaparecem no circuito de festivais após serem aplaudidos em Cannes.
Ralph Fiennes vem trazer o seu "Coriolanus" a Toronto depois de o fazer estrear em Berlim, juntando-se ainda aos três nomes mais sonantes a sair de Sundance: "Like Crazy", "Martha Marcy May Marlene" e "Take Shelter", que procurarão começar as suas campanhas para Felicity Jones, Elizabeth Olsen e John Hawkes e Michael Shannon e Jessica Chastain, respectivamente.
Para quem quiser consultar a programação completa de Toronto, sugiro que dê uma vista de olhos AQUI.
E a vocês, que vos parecem os Festivais deste ano?
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